Os trouxas* que circulavam pela estação férrea de Carlos Barbosa talvez não tenham percebido, mas, no sábado passado, surgiram misteriosas plaquinhas no setor de embarque: plataforma 9 3/4. Essa não foi a única transformação. Ainda soavam os últimos acordes do clássico italiano Volare, pouco antes das 16h, quando a tradicional Maria-Fumaça desapareceu como num passe de mágica para dar lugar ao Hogwarts Express. Aos poucos, bruxos e bruxas de todas as idades começaram a surgir, alguns acompanhados de parentes ou amigos trouxas. Varinhas mágicas nas mãos, todos estavam ansiosos: afinal, seria sua primeira viagem para a Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts.
Para as cerca de 150 pessoas que participaram da primeira edição do Magical Day, promovido pelo fã-clube Alohomora e pela Movetur, entrar no trem era dar início a uma aventura, que trouxe à Serra o mundo mágico de Harry Potter. Nas horas seguintes, muita emoção estava por vir. Ainda antes do embarque, duas bruxas bem conhecidas passeavam pela estação: Molly Weasley, a mãe de Roni e de Gina, e Rita Skeeter, repórter do Profeta Diário (com sua pena e seu caderninho, atenta a tudo). Mas o que chamava a atenção e atraía todos os flashes (sim, os bruxos de hoje andam com seus celulares sempre a postos) era um carrinho de bagagem escorado na plataforma 9 3/4, contendo uma gaiola com uma coruja branca (seria Edwiges?).
Quando os novos alunos finalmente se acomodaram e o Hogwarts Express partiu, pouco antes das 16h30min, um dos guias deu o primeiro aviso: a conjuração de feitiços era expressamente proibida enquanto o trem estivesse em movimento.
SURPRESAS E SUSTOS
Pouco depois, quando o guia terminava de contar a história do expresso, entraram no vagão dois alunos retardatários – um deles, um ruivo meio atrapalhado, e o outro, de óculos redondos e com uma cicatriz em forma de raio na testa. Novos flashes, pois todos queriam registrar a presença de Harry Potter, "o Menino que Sobreviveu" da saga escrita por J.K. Rowling, e seu amigo Roni Weasley.
Eles não foram os únicos famosos a circularem pelo trem. Logo apareceu uma garota de garota de cabelos encaracolados chamada Hermione Granger, procurando um sapo perdido. O dono do tal sapo, Neville Longbottom, passou minutos depois, acompanhado da avoada Luna Lovegood e de Gina Weasley. O malvado Draco e o brutamontes Craig vinham em sentido contrário, com um olhar de repulsa aos sangue-ruins que se misturam aos bruxos puros.
Quando o expresso fez uma parada, novas (e fortes) emoções: mal-encarados invadiram o trem, em busca de Harry Potter. Eram os Comensais da Morte, incluindo Belatrix e o próprio Lord Voldemort. Risos nervosos, alguns gritos.
– Aqui tem um Harry – diz um dos comensais, apontando para um dos bruxos sentados nas poltronas.
– Mas ele é falso – replica outro, seguindo a inspeção, enquanto o bruxo-turista respira aliviado.
Lucius Malfoy (pai de Draco e líder dos Comensais) vai falar com o maquinista, porém a busca não dá em nada. Após passarem por todos os vagões, os Comensais descem do trem, que volta a andar. Com a tranquilidade restaurada, o serviço de bordo começa a vender sapos de chocolate, feijõezinhos de todos os sabores, ovos de acromântula, minhoquinhas e outras guloseimas, rapidamente devoradas.
Do lado de fora, famílias trouxas aproveitam o dia de sol, sem saber dos bruxos que passam no veloz Hogwarts Express, que para eles parece a pacata Maria-Fumaça de sempre.
* Se não sabe o que é trouxa ou outra palavra, confira o glossário na página 7.
Selfies com Hagrid e banquete de boas-vindas
Uma hora e meia após a partida da estação King’s Cross, digo, Carlos Barbosa, o Hogwarts Express chega a Hogsmead (embora, para os trouxas, pareça ser apenas Bento Gonçalves). Como manda a tradição, os novos alunos são recepcionados por Hagrid, o barbudo e simpático meio-gigante que foi quem revelou a Harry que ele era um bruxo. Encantados, os recém-chegados fazem fila para tirar selfies com um Hagrid um pouco mais sorridente que aquele dos livros e dos filmes que há duas décadas conquistam fãs pelo mundo todo.
Em vez de barcos ou carruagens puxadas por testrálios, dessa vez o transporte da estação até o Castelo de Hogwarts – disfarçado sob a fachada da vinícola Cave de Pedra, no Vale dos Vinhedos – é feito de ônibus. Lá, um grupo de mestres recepciona os alunos: Severo Snape, Minerva McGonagall, o estranho Professor Quirrel (que esconde Voldemort sob seu turbante) e o próprio Hagrid. No salão dos banquetes, entre os novos alunos que escutam o discurso de boas-vindas que Dumbledore, o diretor da escola, faz antes do banquete, estava Amanda Caimi, de Porto Alegre:
– Tenho 11 anos, a idade de entrar em Hogwarts. Estou achando tudo muito legal.
Mas nem só de bruxos adolescentes foi feito o Magical Day. A veterinária bento-gonçalvense Raquel Czamanksi, 54, também compareceu vestida a caráter, e contou que é fã desde 2002, quando comprou os livros para os filhos:
– Já fui ao Pottercom (evento de fãs da série), visitei o museu em Londres e o parque temático nos EUA. Também tenho um canal no YouTube em que falo disso.
Próxima viagem
Aqueles que perderam o passeio do dia 2 (ou querem repeti-lo) devem ficar atentos. Marcelo Soares, organizador do evento e representante do grupo Alohomora, conta que já está sendo planejada a próxima edição.
– O que podemos entregar é que será anunciada em breve. Os fãs podem acompanhar as redes sociais do Alohomora e Movetur e descobrir quando poderão voltar a Hogwarts nesse passeio mágico.
Sem medo dos dementadores
– Expecto patronum!
Varinha em punho, Murilo Bettoni Menezes, seis anos, não se amedrontou ao ver os terríveis dementadores – capazes de sugar a alma de sua vítima – circulando pelo salão do banquete em que foram recepcionados os novos alunos de Hogwarts. Como seu ídolo Harry Potter, tratou de enfrentar as criaturas, criando um espetáculo à parte daquele conduzido pelos atores do A Very Potter Musical Brasil, que encarnaram os personagens da saga durante o Magical Day.
O entusiasmo do pequeno fã, aliás, mostrou-se durante todo o passeio. Quando chegou na estação antes do embarque, encantou-se com Edwiges e anunciou aos gritos a chegada do "trem de Hogwarts".
– Ele é muito fã, já assistiu a todos os filmes – contou a mãe, Carolina Bettoni.
Por trás dos personagens
A noite que encerrou o passeio pelo universo mágico de Harry Potter teve ainda música e performances dos 18 integrantes do grupo A Very Potter Musical Brasil, de Porto Alegre – os mesmos que divertiram os participantes durante o passeio, encarnando os principais personagens dos livros e dos filmes.
Fãs declarados da série, os artistas montaram o grupo no ano passado, primeiro como um pocket show para o lançamento de A Criança Amaldiçoada. O sucesso foi tal que o espetáculo cresceu, virando uma compilação de três musicais-paródia do grupo norte-americano Starkid, conta a atriz Kathy Krauser (foto), que fez o teste para viver Hermione mas acabou escolhida para o papel de Roni.
– Fiquei surpresa, mas adorei – garante Kathy, que já trabalhava há vários anos com teatro musical.
Já o ator por trás de Harry é Felipe Assis Brasil, 29, que já havia contracenado com Kathy/Roni no musical O Fantasma da Ópera e cujo currículo inclui 10 anos na Orquestra Sinfônica de Porto Alegre (Ospa).
– Eu já fui par ao teste com a cicatriz e tudo – conta.
No dia 30 de setembro, o A Very Potter se apresenta no Teatro CIEE, em Porto Alegre.
Chapéu Seletor
Uma das maiores preocupações de todo bruxo que começa a estudar em Hogwarts é para qual das quatro casas que compõe a escola ele será destinado. A preferida, claro, é Grifinória – a dos corajosos e que abriga os heróis da saga, Harry, Roni e Hermione. Por isso, foi grande a expectativa com a cerimônia do Chapéu Seletor, realizada antes do banquete.
O primeiro a passar pelo crivo do chapéu falante que perscruta a mente e as habilidades dos neo-bruxos foi Leonardo Boronski La Falce, 12 anos, de Porto Alegre. Para sua alegria, após algumas considerações, o chapéu declarou:
– Grifinória!
Os aplausos foram gerais, e Leonardo comemorou.
– Bem legal, é o que eu sempre quis, desde que vi os primeiros filmes!
Nem todos, porém, tiveram (ou quiseram) esse destino. Também saíram alunos para a Corvinal, a Lufa-Lufa e, em menor número, para a Sonserina. Embora muitos associem essa última casa a Voldemort e seus seguidores, ela tem seus defensores. Um deles é o gestor ambiental Sérgio de Freitas Bontelho, 33. Vestindo uma capa com a parte interna em verde, cor da Sonserina, ele não tinha dúvidas:
– Sou Sonserina de coração e alma. É a melhor casa, entretanto, é muito mal compreendida. Há preconceito, a associam ao bullying, mas esquecem que alunos da Grifinória também cometiam bullying.
Bontelho contou que fez o teste oficial das casas no site Pottermore, e deu essa.
Youtuber
Quem também marcou presença no Magical Day foi o youtuber Renie Santos, que tem um canal especializado em Harry Potter. Ele foi entrevistado por Rita Skeeter e respondeu perguntas do público.