O longa argentino O Cidadão Ilustre – estreia desta quinta na Sala de Cinema Ulysses Geremia – mostra um escritor de grande sucesso voltando à cidade natal da qual estava afastado há 40 anos. Para quem viajou o mundo todo trabalhando com literatura, o retorno à uma comunidade cafona e conservadora por si só já renderia situações suficientemente interessantes para um roteiro bacana. Mas, eis que os diretores Mariano Cohn e Gastón Duprat (mesma dupla por trás do competente O Homem ao Lado) usam essa história como pano de fundo para uma discussão muito mais profunda, que envolve a arte e seu papel na sociedade.
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O primeiro indício dessa temática aparece já na primeira sequência do filme. Quando o escritor Daniel Mantovani (Oscar Martinez) é contemplado com o Prêmio Nobel de Literatura e faz a seguinte declaração em frente à corte real da Suécia: “eu sou o artista mais conveniente para vocês, e essa conveniência tem muito pouco a ver com o espírito da arte. O artista tem que questionar, perturbar. Por isso meu pesar com minha canonização terminal como artista”. Durma com um barulho desses.
O filme logo dá um pulo de uma década para mostrar Mantovani vivendo uma certa reclusão aos holofotes, negando todos os convites possíveis para entrevistas e outros compromissos como escritor. Porém, quando sua agente o informa sobre uma correspondência chegada da prefeitura de Salas – pequena cidade onde o artista passou a infância e a vida jovem –, algo fala mais alto nas intenções de Mantovani. Ele decide então passar quatro dias na comunidade, para receber a nomeação de cidadão ilustre de Salas. Só não esperava que sua passagem por lá pudesse sacudir tanto a pequena comunidade.
Há um tom humorístico muito presente, principalmente na primeira metade da história. A visita do dito cidadão ilustre de Salas inclui um passeio em carro dos bombeiros ao lado da “rainha da beleza” da cidade, uma entrevista incrível numa estação de tevê local, entre outras atividades constrangedoras. De cara, o esnobe escritor parece estar se divertindo com todas as situações e reage a cada abordagem com simpatia e atenção. Mas as coisas começam a mudar quando Mantovani se reaproxima de amigos da juventude. Além disso, o escritor começa a dar discursos mais opinativos nas atividades para as quais é convidado, e isso gera um desconforto na ordem estabelecida no local.
À medida em que o roteiro vai avançando, a história fica mais obscura, testando os limites de cada personagem com relação a cacoetes culturais arraigados pelo tempo. O desfecho escancara as consequências trazidas pelas opiniões firmes de Mantovani, ao mesmo tempo que traz o óbvio confronto do próprio escritor com seu passado. Se o papel da arte é ser perturbadora, como o protagonista defende no início, Salas provavelmente viveu seus quatro dias mais intensamente artísticos na presença do “filho” mais nobre.
Programe-se
:: O quê: longa argentino O Cidadão Ilustre, de Mariano Cohn e Gastón Duprat.
:: Quando: em cartaz de hoje até o dia 23, com sessões de quinta a domingo, sempre às 19h30min.
:: Onde: Sala Ulysses Geremia (Luiz Antunes, 312).
:: Quanto: R$ 10 e R$ 5 (estudantes, idosos e servidores municipais).
:: Duração: 117min
:: Classificação: 14 anos
Veja o trailer