Maria, o mais comum e imaculado entre os nomes femininos, foi colocado no plural para denominar a instalação artística que ocupa a Galeria de Artes do Centro de Cultura Ordovás a partir desta quarta. A escolha se justifica assim que se mergulha na obra idealizada pela artista Carine Panigaz. O assunto abordado machuca, mas é capaz de causar identificação imediata, fazendo das mulheres/Marias um grupo único, infelizmente unido pelas marcas que cada uma carrega na individualidade.
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– É um assunto muito urgente, existe, está na gente. Aqui está uma experiência poética para essa situação, essa violência que a gente sente e não sabe nomear – justifica Carine Panigaz, que formatou o projeto a partir de diversas inquietações pessoais.
É preciso atravessar uma cortina para adentrar o espaço na escuridão da galeria. Essa primeira "porta" que se abre é uma representação do universo (ventre?) feminino. O caminho do visitante rumo ao desconhecido é embalado por áudios gravados pela própria Carine – alternando com outras três vozes femininas – que narram depoimentos reais sobre abusos e violências sofridos.
– Quando pedi no Facebook se alguém queria dividir suas histórias, muitas mulheres se manifestaram, fiquei impressionada como é comum. A maioria das mulheres tem uma história para contar, infelizmente – diz Carine.
O caminho do visitante termina com a representação de uma figura feminina, que não por acaso está encurralada no fundo da galeria, com pés presos por um emaranhado de fios. O corpo é um manequim inerte e pálido – porém com formas reais, não como as silhuetas magérrimas que habitam as vitrines de loja. A Maria ali representada possui pequenas perfurações pelo corpo (sete, na verdade), que podem ser manipuladas por quem visita a instalação. Os fios presos aos pés da mulher possuem conectores em suas extremidades que, quando introduzidos nos plugues distribuídos pelo corpo provocam uma reação imediata. Sempre que essa representação de violência ocorre, uma das luzes conectadas à cabeça da Maria se apaga.
– Os materiais usados para confeccionar a obra estão em qualquer ferragem, assim como um abusador pode estar em todos os lugares. Estamos o tempo todo alertas para esses abusos cotidianos – justifica Carine.
Das "entradas" espalhadas pelo corpo representado na instalação Marias, uma está exatamente na garganta. Carine explica a relação com o silêncio que toma conta de muitas mulheres depois de uma violência, seja verbal, física, psicológica.
– A garganta abafa, muitas não conseguem falar sobre abusos e nem conseguem entender que são vítimas e não culpadas – diz.
A simbologia presente na instalação Marias – com curadoria de Giovana Mazzochi e custeada via Financiarte – evoca a violência, o abuso, as cicatrizes. Mas não só, também propõe sororidade:
– Se está tudo bem para ti, que consiga olhar para as outras, então. Nesse processo todo chorei muito, foi pesado, mas me dei conta também que sou muito privilegiada. Porém, enquanto mulher, é minha obrigação estender a mão para a outra e dizer "tu não está sozinha".
PROGRAME-SE
:: O que: instalação Marias, de Carine Panigaz
:: Quando: abertura nesta quarta, às 19h
:: Onde: Galeria de Artes do Centro de Cultura Ordovás (Luiz Antunes, 312)
:: Visitação: até o dia 7 de junho, das 9h às 22h de segunda a sexta, e das 16h às 22h aos sábados, domingos e feriados
:: Quanto: entrada franca