Há muito mais coisas em comum entre rolos de papel higiênico e uma dúzia de pedras do que pode imaginar nossa vã criatividade. Aparentemente sem serventia, os objetos transformam-se em ferramentas capazes de despertar o interesse até da mais tímida das crianças. E, quando usadas em oficinas ministradas por educadores de áreas distintas, entre elas a arquitetura e a língua portuguesa, por exemplo, garantem o aprendizado de forma lúdica e divertida.
Eram 17h45min de quarta-feira, e Sofia Kappes Randon não disfarçava o sono depois de mais um dia letivo no Colégio La Salle Carmo, em Caxias do Sul. Debruçada sobre a mesa da Sala de Artes, a menina de quatro anos estava quieta. Quase dormiu à espera da próxima atividade: a oficina de arquitetura para crianças, da qual participa uma vez por semana. Com o sugestivo nome de Arquitocos, em referência à baixa estatura dos pimpolhos, a proposta da arquiteta e professora Isabela Rech Schumacher faz sucesso entre os alunos, entre eles Sofia, que despertou tão logo a educadora lançou o desafio de criarem construções com os tubos de papelão extraídos do interior de rolos de papel higiênico.
Nos encontros, os estudantes aprendem, entre outras, lições como formas geométricas, encaixes, equilíbrio, luz e sombra por meio de dinâmicas que utilizam, na maior parte do tempo, material reciclado. A oficina é oferecida a crianças da educação infantil ao sexto ano do ensino fundamental, divididas em duas turmas em horário extraclasse. As idades variam de três a 12 anos.
– Hoje em dia, eles têm acesso a praticamente tudo, e aqui é um momento em que podem brincar e extravasar. Também procuro abordar questões como o desperdício e o uso consciente dos materiais – explica a professora.
E como a imaginação não tem limites, Sofia resolveu construir dois prédios com uma rede para se deitar entre as torres. Foi a primeira a concluir o início do exercício e estava pronta para colorir sua obra. Os colegas continuaram na montagem dos projetos. Não demorou muito e as mãos de Sofia já estavam cobertas por tinta guache. O sono já havia passado há tempo.
A essa altura, Maria Fernanda De Negri Pereira terminou o castelo de princesa. Aos cinco anos, a menina é fã de Ariel, “aquela que tem uma cauda de peixe”, mas explica: a torre que recebe pinceladas de tinta rosa é de outra princesa.
– Aquela que tem o cabelo muito grande_ conta a estudante, que adora a cor cinza. – Mas não gosto de azul porque sou do Inter – salienta.
Uma rápida passada pelos outros “arquitetos mirins” revelou como a criatividade varia de um para outro. Com a mesma idade de Maria Fernanda, Felipe de Oliveira Nunes ergueu uma torre com um canhão de guerra instalado no topo. Artur Lovatel Lazzarotto, seis, fez “um clubinho secreto”, enquanto Estevan Rech Ramos e Isabella Rech Sandi, ambos com cinco anos, também projetaram prédios.
Enquanto esperava os demais terminarem, Sofia pediu ajuda para a arquiteta. Unidos com fita crepe, dois tubos de papel viraram um binóculo, com o qual ela posava faceira para o fotógrafo, e encontrava um novo jeito de olhar para o mesmo mundo. Um jeito bem mais divertido.
Imaginação é a principal regra
Usar o máximo de imaginação para criar histórias, reais ou fictícias, é a regra número um da oficina de escrita criativa que a professora Lu Vicenzi ministra para crianças de oito a 10 anos na Casa do Meio. Em módulos de aproximadamente duas horas e meia, os aprendizes realizam atividades com o objetivo de desenvolver habilidades como raciocínio lógico, coerência e as diferentes formas de escrever.
– Hoje em dia, a gente se esconde através do mundo virtual. Muitas crianças se prendem muito a tablets e celulares, o que pode acabar inibindo a criatividade, e a criatividade é o diferencial do mundo – acredita a instrutora.
O ponto de partida é sempre a oralidade. Numa das brincadeiras, pedras com figuras de pessoas, animais e objetos como bicicleta, casa e carro servem de inspiração para a narrativa. As crianças sentam-se em círculo e cada uma conta uma parte da história, em sequência, inserindo nela o novo elemento contido na pedra tirada de um saco de pano. Em seguida, todos escrevem a história, da maneira que a compreenderam.
Em outra dinâmica, todos se posicionam em roda, no escuro, como se estivessem ao redor de uma fogueira no acampamento. Aleatoriamente, a professora aponta o foco de uma lanterna para os alunos, que precisam continuar a trama do ponto anterior. Uma terceira possibilidade é o sorteio de palavras que precisam ser usadas na contação.
– Como o objetivo é estimular a imaginação, a cobrança em relação a questões gramaticais e ortográficas não é tão dura. É o escrever pelo escrever. Quando há muita cobrança, acabam tendo um bloqueio. A única exigência é que as histórias tenham começo, meio e fim – afirma Lu.
Clara Zancanaro Berticelli, Ana Clara Vicenzi de Aguiar e Lucas Mainardi Kaminski, todos com nove anos, divertem-se criando tramas mirabolantes. Tudo é válido quando o objetivo é despertar o interesse pela leitura e pela escrita. Fã da série Diário de um Banana, Lucas acredita que as brincadeiras ajudam a ter um vocabulário melhor na hora de escrever.
Nova perspectiva
As aulas de fotografia fizeram Manuela Suzin Mantovani, 12, perceber o mundo com outros olhos.
– Passei a prestar mais atenção nos detalhes – conta a estudante.
Desde que participou de uma oficina com a fotógrafa Liliane Giordano, há três anos, a câmera fotográfica tornou-se companheira quase inseparável da menina em viagens e passeios de fim de semana. Tamanha foi a identificação com a fotografia que, em 2015, Manuela realizou a primeira exposição, com imagens registradas no antigo campo de concentração nazista de Auschwitz, na Polônia. E sempre que pode, ela sai para clicar paisagens, seu tema favorito. Mãe de Manuela, a dentista Luciane Suzin Mantovani lembra que o curso foi um pedido de aniversário da garota e que se surpreendeu com a desenvoltura da filha atrás da câmera.
– Ela sempre foi bem tímida, mas com a máquina ela se solta – conta Luciane.
Para Liliane, a oficina proporciona uma nova perspectiva aos jovens aprendizes. As aulas são realizadas no estúdio e em saídas pelas ruas de Caxias do Sul e de cidades próximas. Durante o curso, os alunos estudam os conceitos básicos da fotografia, como luz, sombras e cores, e aprendem a respeito da parte operacional da câmera. Nos dias 25, 26 e 27 de julho, um workshop terá como tema a Fotografia Criativa. Mais informações pelo telefone (54) 3534.8994.
"A palavra chave é diálogo", diz especialista
Coordenadora do curso de Pedagogia da Universidade de Caxias do Sul (UCS), a professora Cristiane Welter aponta o diálogo com a criança como parte fundamental no processo de escolha da atividade que será realizada. Segundo ela, é importante que pais e filhos conversem bastante antes de tomarem a decisão.
– Tem que ficar claro para todos quanto à duração da oficina e os objetivos que se pretende alcançar. Também não pode ser algo que deixe a rotina das crianças muito cansativa. Elas têm de ter tempo para brincar na pracinha, para se relacionar com os outros e também para ficar sem fazer nada – alerta Cristiane, doutoranda em Educação.
A educadora salienta que as oficinas extracurriculares são uma oportunidade para que os filhos explorem diferentes áreas, que poderão ser aprofundadas com o passar do tempo:
– Mas não pode achar que só porque são pequenas, as crianças devam fazer tudo o que os pais acham que é bom para elas. A palavra-chave é diálogo.
Inscrições abertas
:: O Senac Caxias do Sul oferecerá uma oficina de culinária kids para crianças a partir de oito anos, nos dias 25, 26 e 27 de julho. As aulas serão ministradas pela chef Vanessa Pacheco, das 14h às 17h. Mais informações:(54) 3225.1666.
:: A CIC de Caxias do Sul está com inscrições abertas para o Programa Nossos Jovens. Voltado para crianças a partir de 12 anos, filhos de empresários ou de seus funcionários e interessados, o projeto é composto por oito módulos, que se iniciam em agosto e prosseguem até novembro, totalizando 48 horas. O primeiro módulo será realizado nos dias 8 e 11 de agosto, das 14h às 17h, no Espaço Empresarial CIC. Entre os temas a serem abordados estão autogestão do conhecimento, plano de carreira, educação financeira, postura profissional, dicção, expressão vocal e oratória, comunicação assertiva, relações interpessoais e mídias sociais.Outras informações pelos telefones (54) 3218.8038 ou 3218-8058, pelo e-mail cursos@ciccaxias.com.br ou no site www.cic-caxias.com.br.