Se não fosse a última noite de Natal, não saberia dizer quando tinha sido a última vez que deitei no colo da minha mãe. Quem sabe tenha sido muitos anos atrás, em uma adolescência recheada de dramas e tristezas temporárias. De lá pra cá, substitui tudo isso pelos abraços casuais e em datas especiais, mesmo que eles tenham sido raridade durante o tempo de pandemia. Meus problemas agora são outros, e a vida de adulto me encorajou silenciosamente a lidar com todos eles por conta própria. Confesso: é tão mais difícil...
Desta vez, puxei uma almofada e deitei no colo da minha mãe não porque eu estava mal, mas porque ela ainda está aqui. Prego tanto em minhas palestras isso de nos beneficiarmos das coisas boas quando tudo está bem, e não só quando efetivamente precisamos, que aquele gesto foi um exemplo colocado em prática. Ali, recebi até cafuné, algo que nem o mundo nem eu mesmo tenho me proporcionado ultimamente. E é estranho (pra não chamar de bizarro) pensarmos que a gente se acostuma com a falta de um carinho, de alguém que passe a mão na nossa cabeça — agora, literalmente.
O colo de mãe é a nossa primeira casa. Quanto mais pertinho, maiores as chances de se escutar as batidas do seu coração e recordar do tempo que dividíamos o mesmo lar. Deitado ali, lembrei de algo que havia pensado recentemente: todos nós temos diversas cicatrizes, visíveis ou não, mas a que perdura desde o primeiro dia no meio do nosso corpo, que guia do nascimento à morte, é o umbigo. A primeira tatuagem das nossas vidas, símbolo de uma conexão física e espiritual com o materno. Assim sendo, voltar a este ninho é simplesmente reconhecer-se, sentir que ainda pertencemos, independente da idade.
Hoje eu sei me virar sozinho. Por mais que a vida pregue peças aqui e acolá, já entendi que esse é o jogo e que sou só mais um a jogar. A cada tombo, tropeço ou queda, agora já me reergo porque lá atrás aprendi — de novo com a minha mãe — que nem sempre dá pra chorar. Tem vezes que a gente precisa levantar, limpar a sujeira e apenas seguir em frente. Todavia, não nego: é bom saber que ainda existe um afago em meio a um mundo que parece chover navalhas. Deitado no colo da minha mãe, lembrei que foi ali que aprendi que não só nunca estive sozinho, como também sempre tenho para onde voltar.