Paro o carro no mesmo sinal umas duas ou três vezes por semana. Dificilmente pego a luz verde, e a pausa não planejada já me fez assistir ao mesmo malabarista revezando bolas de tênis no ar umas tantas vezes. Como fiel espectador, analiso sua performance e crio meus comentários mentais – por mais que a apresentação seja gratuita. Entre todos os meus elogios e admiração pela habilidade, reside uma única crítica: a demora para encerrar seus malabares faz com que não sobre tempo para arrecadar dinheiro entre os veículos.
Em média, já faz uns 3 mil anos que o tempo existe. Quando os babilônios o criaram, creio que não sabiam o quanto poderíamos usá-lo como justificativa sempre que não dispusemos de uma. Culpabilizar o tempo é uma alternativa bem-vinda porque ele não possui CPF e endereço – até existe, mas ninguém sabe ao certo dizer como. Einstein bem que tentou pontuar que o tempo é relativo, uma vez que podemos acelerá-lo ou freá-lo, porém a sensação de escassez parece ser permanente. Quando a vida adulta chega, tudo passa a ser sinônimo de uma contagem regressiva. São tantos dias para o final de semana, tantos minutos para encerrar a jornada de trabalho, tantos segundos para o sinal abrir.
Eu bem que tentei sugerir ao malabarista que ele reduzisse a sua performance, sobrando algum tempo para circular entre os carros. Acontece que não deu tempo. Quem sabe se ele recebesse esse olhar de fora, de quem assiste, ficaria mais fácil perceber que, para ele, três segundos são determinantes. Assim como a luz, que viaja 300 mil quilômetros a cada segundo; como a comida que leva sete segundos para chegar ao estômago; ou ainda como os homens que passam 8,2 segundos admirando uma mulher até se apaixonar, não só tempo é dinheiro, como também uma resposta do presente decisiva para o futuro. Foram só 11 segundos até que uma das torres gêmeas desmoronasse durante o atentado que mudou a história dos Estados Unidos para sempre.
Até pensei que toda essa minha reflexão talvez fosse desnecessária (ou “perda de tempo”), caso o artista só estivesse artistando mesmo. Isso até ontem, quando parei no sinal e fiquei uns carros para trás. Mesmo encerrando o seu número tarde demais, ele costurou entre os veículos em busca de uns trocados, e pelo menos naquele fragmento de tempo o público não retribuiu. Isso porque o sinal já estava verde, e a vida urge incessantemente e nós só obedecemos.
Queria contar a ele que uma vez o Hamilton venceu uma corrida por 59 milésimos de diferença, ou que só leva meio segundo para o ser humano tecer uma primeira impressão ao conhecer alguém. Queria contar que somos efêmeros e adotamos esse nome por conta das efeméridas, inseto que nasce, vive e morre em pouquíssimas horas. Entretanto, mesmo que estivesse determinado em minha tentativa mais recente, o carro de trás buzinou porque não tinha tempo para esperar e eu precisei manter o pé no acelerador. Ironicamente, no rádio do carro o Lulu Santos cantava que “nada do que foi já é igual ao que a gente viu há um segundo”.
E é isso, Lulu. Realmente, tudo muda o tempo todo no mundo.