A porta do avião fecha e na mesma hora percebe-se a vulnerabilidade pairando no ar. É inevitável até mesmo para aqueles que não têm medo de altura: e se o próximo acidente aéreo ocorrer bem neste voo? A aeromoça conforta os delírios silenciosos mesmo que a maioria nem preste atenção. "Em caso de despressurização da cabine, máscaras de oxigênio cairão automaticamente", repete pela vigésima vez na semana. Preocupados com o aperto entre os assentos, a demonstração passa em branco porque insistimos em ignorar aquilo que acreditamos já saber. Mas eu tenho certeza que pelo menos uma pessoa dentro da aeronave faria exatamente o oposto que foi ensinado pela aeromoça.
Estou chutando baixo. Não sei se existe uma média de mães por voo, mas seja lá quantas forem, tenho certeza que todas descumpririam as normas de instrução. Reparei nisso enquanto conversava com, veja só, minha mãe. Foi fácil concordarmos que ela (e toda e qualquer mãe) agiria por impulso em meio a uma emergência. E por impulso entende-se que nenhuma delas colocaria primeiro a máscara de oxigênio em si e só depois no rosto do seu filho, sentado na poltrona ao lado. Os filhos vêm antes de tudo.
"Mãe, mas se você colocar a máscara primeiro em mim, você vai ficar sem oxigênio e talvez no fim nenhum de nós consiga colocá-la antes de perder os sentidos" provoquei.
Não adianta. Foi o que ela disse e é o que reafirmo, mesmo não tendo filhos para dividir o sentimento. Nem a chegada da minha vida adulta fez ela pensar diferente. "Ninguém convence o instinto materno do contrário, filho... Primeiro você, depois eu. Sempre", ela disse.
Levei a situação para outras mães e a resposta foi a mesma. Em meio ao caos, qualquer mãe se sacrificaria em detrimento de seu filho. E foi assim que eu aprendi que essa seria a única forma de tentarmos explicar o amor. Aqui, em sua mais pura forma, ele se justifica: é quando sentimos muito que temos vontade de abrir mão de nós mesmos em prol do outro, mesmo que, conscientemente, tenhamos a certeza de que estamos errados.
É assim com os relacionamentos, amorosos ou não. Queremos o bem do outro sem antes se preocupar com o nosso próprio bem. Quando amamos, pensamos ser polvos com braços que podem abraçar todos aqueles que precisam, mas será que alguém nos abraça de volta?
Ser mãe talvez seja abrir mão de qualquer egoísmo que já existiu do lado de dentro algum dia. É zelar ininterruptamente, por mais caótica que a rotina materna esteja. Por aqui, tenho certeza de que sempre vai ser uma tentativa frustrada, mas o meu papel de filho já educado e crescido é continuar dizendo: mãe, chegou a hora de cuidar de ti. Da próxima vez, eu é que vou colocar a máscara em você.