Dia desses tropecei numa ideia, numa imagem, num rascunho com aroma e textura de crônica. Apareceu despretensiosamente, estranhamente como uma oblíqua analogia. E uma certeza: há mais zumbis por aqui do que supomos e haverá ainda mais em 2025.
Um dos personagens é um jovem, não mais do que 20 e poucos a anos, barba por fazer, cabelos desgrenhados, esguio e franzino. Ele caminhava devagar, não por dificuldade de locomoção, era como se ele se demorasse na observação do chão onde pisava, ou como se contasse um por um dos paralelepípedos. Caminhava do nada ao lugar nenhum, olhar vago, como um zumbi.
Outra personagem. Uma senhora, entre os 60 e 70 anos. Charmosa, vestia tailleur, exibindo elegância e formalidade. Observava com atenção cada peça exposta na vitrine de uma famosa loja de bolsas importadas. Nenhuma das bolsas expostas ali chegava à altura da sua, na tonalidade vermelho rubi e com a alça dourada. Apesar disso, com um certo olhar vago, como um zumbi, não resistiu ao doce e sedutor encanto do consumismo, e comprou mais uma bolsa.
Insisto, e não para por aí, há um sem fim de exemplos. Há zumbis dentro de fábricas e escritórios, nas redações de jornais, em salas de aula, em praças e parques, praticando exercícios, correndo maratonas, construindo casas, pintando paredes. Todos em movimento, mas estranhamente inertes. Incapazes de sorver a vida com vivacidade. Nesse mundo cada minuto mais artificialmente inteligente e menos arbóreo, o zumbilismo é a nova pandemia.
— Virei zumbi, Mugnol, me reconheci nessa paranoia. E agora?
Dica número 1: encontre zumbis parecidos com seu tipo, com os mesmos gostos e interesses. Dica 2: fale sobre isso, abertamente, não tenha medo, somos todos, em última instância, “zumbis” de alguma espécie. Dica 3: não despreze nem julgue quem não se reconhece zumbi; é tudo uma questão de tempo. Dica 4: exercite a empatia e abrace a dor-zumbi do outro.
Enfim, adaptação é a palavra-chave. Adaptação às idiossincrasias dessa pós-modernidade volátil, rumo ao iminente apocalipse, é o que nos resta.
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Convite
A você que me acompanha aqui, sempre às quintas-feiras, tenho um convite a fazer. Nesta sexta-feira, dia 6, a partir das 18h30min, vou lançar meu novo livro de crônicas. A sessão de autógrafos vai rolar lá no Zarabatana Café — tema e inspiração de diversas crônicas. Pinta lá, vou te receber com uma dose do néctar precioso que já virou sinônimo de Brasil.