Morreu na manhã desta segunda-feira (8), em Caxias do Sul, Amaro Francisco de Albuquerque, aos 68 anos. Amaro Albuquerque, profissão impressor de gravuras, ofício cada dia mais distante das novas realidades virtuais, era mais conhecido na UCS, onde exerceu a maior parte de sua carreira, como Seu Amaro.
Ele nasceu em Vitória de Santo Antão, que fica na Zona da Mata, em Pernambuco. A cidade é retratada na música Vitória de Santo Antão, gravada por Luiz Gonzaga no disco São João do Araripe, de 1968. Aliás, a nova geração deve se lembrar de Lisbela e o Prisioneiro (2003), dirigido por Guel Arraes. Pois então, a história, baseada na peça teatral de Osman Lins, é ambientada na terra de Amaro. Contudo, o filme foi rodado em Recife, na capital pernambucana. Que ironia, não?
Por volta de 1975, com cerca de 20 anos, Amaro tomou o rumo do centro do país. Como se cantarolasse os versos da canção de Luiz Gonzaga, "Aqui vou deixar meu coração / Adeus, Vitória de Santo Antão", foi parar em São Paulo, onde encontrou trabalho e sustento em um ateliê de artes. Amaro foi forjado pelo Centro de Estudos Aster (1978-1981), onde trabalhava gente do quilate de Julio Plaza (artista espanhol radicado no Brasil, morreu em 2003) e Regina Silveira (nascida em Porto Alegre, artista multimídia, gravadora, pintora e professora).
— Quando o Amaro chegou em Caxias é que foi ser alfabetizado e concluiu os estudos — recorda a artista caxiense Diana Domingues, responsável por trazer o impressor para a cidade.
— O Amaro veio pra cá em 1981, porque compramos a prensa de gravura do Julio Plaza. Aí, o Walter Zanini, que era curador da Bienal de São Paulo, na época, disse pra mim que era melhor trazer o Amaro junto pra ele fazer funcionar a prensa no Atelier Livre — complementa Diana.
— Me lembro que fomos buscá-lo na rodoviária e ensinamos como ele deveria fazer pra ir até o Atelier, que ficava perto do Ópera.
Depois do Atelier Livre, Amaro teve passagens pela gráfica e editora da UCS e, depois, no Campus 8, dedicando-se ao Clube de Gravura, imprimindo o seu talento nas obras de alunos e artistas da Serra gaúcha, como Clara Koppe, Sergio Lopes, Odilza Michelon, Ana Vergamini, Mara De Carli, Rita Brugger, Marinês Busetti, Madia Bertolucci, entre tantos outros. Amaro saiu da UCS em 2020, deixando como discípulo o gravurista e impressor, Gelson Soares.
De Vitória de Santo Antão, passando por Sampa e, agora, Caxias do Sul, Amaro deixou um pedaço do seu coração por onde andou. De poucas palavras, silenciosamente imprimiu vida e obra em centenas e centenas de gravuras.
Ele foi sepultado segunda-feira (8), no Cemitério Público Municipal.
Depoimentos de quem conviveu com Amaro Albuquerque
"Conheci o seu Amaro, quando ele ainda era impressor do NAVI (Núcleo de Artes Visuais de Caxias do Sul), quando comecei a fazer gravura. Quando comecei a dar aulas na UCS dei as disciplinas de gravura e ele atuava como impressor. Foi muito importante o conhecimento que ele tinha nessa área de impressão e até de gravação de imagens, porque só pelo olhar ele sabia se ia dar certo ou não. O processo de gravura tem muitos detalhes e ele tinha uma visão muito ampla por ter trabalhado com grandes artistas brasileiros. Ele era uma pessoa muito especial. Difícil resumir seu Amaro numa frase, só, sabe?!, fiquei muito sentida"
JANE DE BHONI, professora e artista visual
"Além do grande profissional que ele era, o Amaro era uma das pessoas mais gentis que conheci na minha vida. Quando gentileza é algo quase extinto, o seu Amaro representa a pessoa mais educada, generosa e prestativa, um verdadeiro gentleman. Ele dividiu com a gente a sabedoria de anos de trabalho como impressor de grandes artistas como Regina Silveira e Marcello Grassmann e, que por um período muito grande, os aristas e os alunos de artes em Caxias, tiveram o privilégio e alegria de ter não só a companhia especial dele, mas também do excelente profissional que ele foi".
MARA GALVANI, coordenadora do Clube de Gravura da UCS
"Seu Amaro foi um grande impressor! Dedicou grande parte da sua vida ao trabalho junto a artistas caxienses e de todo o Brasil. Foi uma pessoa dedicada a um ofício que hoje é raro e que era fundamental para a qualidade técnica dos processos de gravura: a melhor gravura depende tanto do impressor quanto do artista. Teve o respeito de todos que passaram por ele na UCS, na editora/gráfica e dos colegas, professores e estudantes do Campus 8 nas duas últimas décadas. Teve a nobreza de incentivar um estudante a seguir o seu ofício na UCS, quando da sua aposentadoria, em 2020".
SILVANA BOONE, coordenadora dos cursos de Artes Visuais da UCS