Inspirada no fenômeno da personagem Keila, da atriz gaúcha Ilana Kaplan, que ensina aspectos da vida online, a coluna foi buscar em Flora Julia Magnabosco, referência em comportamento na região, informações e dicas para afinar o tom das regras de etiqueta que movem o mundo contemporâneo e virtual.
Flora, nascida sob a égide de sagitário e com alegria em conviver, é filha do caxiense Dirceu Homéro Magnabosco e da italiana Inês Tomé Magnabosco (in memoriam). Com sangue ítalo-brasileiro que já lhe confere, naturalmente, a habilidade necessária para a comunicação, Flora destacou-se no cenário local como Princesa da Festa da Uva 1991, atuando também em emissoras de rádio locais nas quais apresentava boletins semanais sobre comportamento social, adquirindo o referido know-how, para permitir-se compartilhar experiências e sua vivência.
Ministrou palestras para debutantes dos clubes sociais de Caxias do Sul e também para candidatas, em diferentes anos da Festa da Uva, assim como nesta edição. No início dos anos 2000, a convite de uma escola de ensino privado, fez parceria com a então Princesa de 2002, Fernanda Frigeri Martins Nora, e ministraram oficinas de comportamento para os alunos do Ensino Fundamental. Formada em Psicologia pela Universidade de Caxias do Sul, atualmente é Embaixadora do Turismo de Caxias, ao lado deste colunista. É casada com o cirurgião plástico Roberto Carpeggiani.
João Pulita: O que é ser elegante? De onde surgiu essa necessidade por padronizar o comportamento social e por que está tão em evidência mesmo em tempos de pandemia?
Flora Julia Magnabosco: A elegância está na alma do indivíduo, por meio da atitude que o mesmo tem frente aos demais e na sensibilidade em colocar-se no lugar do outro, a chamada empatia. Contudo, as normas de etiqueta foram criadas em benefício de um determinado grupo social do século 16 e que, com o decorrer do tempo, foram atualizadas e tornaram-se imprescindíveis em nome do bom convívio. Com o passar dos anos, tornaram-se mais flexíveis, estando acessíveis a quem possa se interessar em aprimorar o conhecimento, por meio de pesquisas na internet ou adquirindo bons manuais. Regrar é fundamental e vai muito além de saber montar uma mesa ou vestir-se de acordo com a ocasião. São instruções que harmonizam o convívio e evitam o caos. Algumas regras seguem atemporais, assim como ser pontual, devolver o livro que se pediu emprestado, não furar filas e não jogar lixo no chão.
Vale a pena ressaltar que o fator cultural é preponderante e determina suas próprias direções, assim como no Japão costuma-se tirar os calçados ao entrar em determinados locais. Mas tratando-se da pandemia, o mundo todo, independentemente da cultura, precisou fazer valer muitas regras que já existiam, criar novas e abolir outras, por puro instinto de sobrevivência. Algumas das recomendações apenas foram reforçadas como manter a distância do interlocutor e não tocá-lo. Contudo, abolimos os cumprimentos, uma vez que se recomendava que nunca deveríamos negar um aperto de mão, e acabamos tendo que substituir por um toque despretensioso de cotovelo. Por respeito ao próximo e a si mesmo, a exigência do uso da máscara e da higienização constante das mãos, acabaram protagonizando mais um capítulo dos manuais de etiqueta. Em se tratando de interações sociais que, abruptamente, foram direcionadas ao mundo online, cabem algumas constatações. Interagir com amigos ou usar a internet por motivos profissionais, requer os mesmos cuidados pessoais que mantínhamos nos tempos de proximidade real. A escolha do cenário, o capricho na aparência, seja no uso de roupas adequadas, ou até mesmo no simples cabelo penteado, nos remete não somente a uma questão da autoestima, mas denota que valorizamos o sentimento de sociabilidade.
Em um mundo cada vez mais conectado, qual sua dica sobre o uso de aparelhos celulares e reuniões virtuais em ambientes de trabalho e entre família e amigos?
O uso indiscriminado do celular merece um estudo aprofundado, pois é difícil compreender o motivo que leva a pessoa, nos momentos de lazer com amigos, ou até mesmo nas refeições, a considerar o celular como uma extensão do corpo, apenas com o objetivo de atualizar o feed de notícias. Não seria mais proveitoso valorizar a presença do outro? Há exceções, sejam elas nas reuniões de cunho profissional, ou até mesmo, quando se aguarda um retorno importante. Sugiro que se comunique a real necessidade em permanecer conectado para evitar as tais gafes modernas. Tratando das aparições online, manter a câmera ligada e saber usar a voz, demonstra adequado grau de interesse. No que diz respeito à etiqueta virtual, o excesso de exposição, por meio da imagem ou de opiniões, trouxe consequências positivas e negativas, pois a internet não tem fronteiras e o zelo pela imagem é um ato de amor próprio.
E quanto à credibilidade?
Pode parecer exagero, mas o que for divulgado poderá minar a credibilidade, por mais simples que seja a mensagem. Emitir juízos de valor depreciativos comprometem e arranham a imagem, além dos erros de ortografia. Pensar que a vida pessoal e profissional não se misturam é um engano, pois ambas habitam em uma só pessoa. Talvez seja desnecessário mencionar que respeitar a privacidade dos outros e não postar sem o devido consentimento seja um fator preponderante no harmonioso convívio, até por motivos de segurança.
A elegância ainda é associada às elites?
De forma alguma, pois ser elegante independe do status quo do indivíduo ou da marca de roupa que veste ou do lugar que está, seja sentado no chão ou em uma poltrona sofisticada. Ser elegante esta na leveza e na essência e não depende, exclusivamente, do domínio das regras.
O que é preciso para ser um bom anfitrião?
A premissa básica é não tentar constranger o convidado, mas fazê-lo sentir-se acolhido. Uma dica importante para alguma situação formal é observar quem domina a arte e imitar, sem medo. Não há mal algum nisso, afinal somos todos aprendizes.
O momento atual carece de um divã no que diz respeito ao comportamento social? Alguma recomendação?
Parece clichê, mas ser gentil e discreto, dando espaço para o outro brilhar, não vangloriando-se de suas conquistas, já seria um bom começo para manter as relações interpessoais produtivas. Como referência no tema sugiro as bibliografias bem humoradas de Danuza Leão e, no universo virtual, recomendo acompanharem a interpretação da atriz gaúcha Ilana Kaplan. Ostentar gratidão, tolerância e exercitar a solidariedade nunca estiveram tão em voga no comportamento social, como nos dias de hoje.