Presumimos saber a melhor solução para os problemas dos outros. E nos admiramos ao perceber como não a encontram, pois está diante deles. Agimos assim frente ao relato de situações conflitivas envolvendo amigos ou desconhecidos. Pois é, só que a realidade é bem diferente. Cada um lida com ela a partir de seus recursos internos, suas vivências e a administração dos aspectos emocionais. É fácil falar, mas na prática costuma ser mais complicado. Sempre me impressionou como desconsideramos essa verdade. A maturidade nos revela ser equivocado acreditar na nossa capacidade de propor, com fulgurante lucidez, o melhor caminho para extinguir o sofrimento alheio. São tantas as questões de cada enredo, que mal raspamos a primeira camada de entendimento. Com o correr do tempo misturamos alegria, contentamento, dor, angústia e frustração, e eles vão se acumulando dentro de cada um. É simplificar demais algo extremamente complexo.
Uma conhecida permaneceu casada por mais de quinze anos com um homem abusivo. Se olhasse para alguém inocentemente, a agressão já se anunciava. Era tudo bem difícil mesmo. Ela cuidava da casa e dependia financeiramente do marido. E tinha dois filhos pequenos. Para culminar, a família, católica fervorosa, via a separação como sinônimo de vergonha, um inequívoco sinal de fracasso. E ela foi ficando, ficando. Todos ao seu redor pareciam ter a resposta mágica, espantando-se como conseguia manter uma postura tão passiva. Inaceitável. Mas ninguém sabia da longa história de horrores que sua mãe e uma irmã haviam suportado. Aquilo ficou impregnado em sua pele, como uma tatuagem irremovível. Depois de muita terapia e enorme esforço, conseguiu dar um basta a esse ciclo de violência e iniciou uma jornada saudável. Ainda hoje lhe perguntam como demorou tanto tempo para tomar essa decisão. Afinal, em tais circunstâncias, “qualquer um” saberia como romper essa brutalidade.
O melhor auxílio a oferecer é disponibilizar-se para uma escuta atenta, afetuosa. E evitar ao máximo emitir algum julgamento. Sugestões são bem-vindas, mas devem ser só isso. Apontar o dedo em riste não ajuda em nada. No futuro talvez sejamos nós a ser atravessados por algo semelhante. Se fosse tão fácil resolver o que nos machuca, os boletins de ocorrência cairiam para quase zero, por exemplo. Cada experiência pessoal está impregnada de subjetividade. Só pertence ao protagonista. Então, na maioria das vezes o acolhimento pode ser a melhor maneira de prestar auxílio. E refletir antes de emitir opiniões mostra-se um componente valioso. Acaba reforçando nosso interesse e fortificando uma relação de amizade.
Vale para mim e para você: só num mundo imaginário, idealizado, a salvação cai do céu. É preciso exaustivo trabalho interior para vislumbrá-la. Enquanto isso, vamos ensaiando a melhor maneira de lidar com “a dor e a delícia de ser o que é”.