Conheço uma pessoa muito, mas muito querida. Prezo tê-la por perto. Só que fala compulsivamente. Parece uma metralhadora verbal. Os assuntos aos quais se refere são agradáveis, envolventes até. Ela é sagaz e, quando consegue sair do cercadinho, faz análises pertinentes, argutas. É comum as conversas começarem assim: “Gostaria da tua opinião sobre essa situação bem incômoda.” Porém, segue-se um monólogo com duração indeterminada. No final do encontro, sinto-me exausto. Sim, estamos todos carentes e implorando por ouvidos alheios para aliviar a tensão causada por dias de estresse e excesso de trabalho. Mas, sinceramente, acho esse tipo de catarse sem resultado, fadada a esgotar o interlocutor e dificilmente capaz de resolver qualquer conflito. Entretanto, venho exercitando a tolerância, absorvendo com real interesse o que mobiliza tanto a pessoa atormentada, ora diante de mim. Valho-me de um recurso: criar uma espécie de bolha para me proteger da contaminação emocional. Fico presente, com o pensamento atento, mas evito me impregnar com o drama narrado. E, depois, já devolvido ao silêncio, empenho-me em entender as razões de tal comportamento.
Sabemos pouco de nós e menos ainda dos demais. O que me deixa indiferente pode ser motivo de grande aborrecimento para você. O campo psíquico é cheio de surpresas e as demandas internas só ocasionalmente são compreendidas, mesmo se nos predispomos a entender a vulnerabilidade humana. Às vezes estabelecemos guerras interiores por situações passageiras e contornáveis. Mas é como as sentimos no momento, dificultando minimizá-las. Então, para tantos, a única maneira de suavizar a aflição é manifestá-la em voz alta. Pode-se observar que não é regra buscarem soluções alheias para seus problemas. Desejam simplesmente aliviar a tensão partilhando seu drama. Confesso: nem sempre sou esse ouvinte atencioso. E me culpo por isso. A meu favor posso dizer do empenho em não sobrecarregar ninguém com problemas domésticos. Aprecio a ideia de decantá-los para, só então, tomar uma decisão pertinente. Estou longe de servir de modelo nesta questão. Meu esforço se dirige no sentido de, em havendo necessidade de diálogo para um propósito de aconselhamento, levar a sério o que tem a me relatar. A bem da verdade, comprovadamente eficaz seria procurar um terapeuta.
Se me encontro de bom humor, encaro esse empréstimo de tempo até com simpatia. Agora, em me faltando paciência, conto os minutos para desviar-me, escapando da possibilidade de ser atingido por saraivadas confessionais. Entre um e outro, vou tentando entender esse fenômeno tão contemporâneo. Se abdicamos de acreditar que o centro do mundo se situa exatamente em nós, talvez as relações possam ser equilibradas, com o pêndulo oscilando para os dois lados. Caso contrário, continuaremos ouvindo somente o eco de nossa própria voz.