A mãe e as tias foram pessoas profundamente religiosas. Seguiam os ritos da liturgia católica e frequentavam regularmente a igreja. Sentiam-se consoladas pelas doenças e dificuldades enfrentadas durante a vida. Era uma atitude de passividade, mas também de aceitação serena diante daquilo que não podia ser modificado. À sua maneira, atravessaram com sabedoria instintiva os momentos em que foram testadas na sua capacidade de se distanciarem da revolta contra as injustiças sofridas. Em algum momento elas farão parte incontestável da nossa existência. Infelizmente, não herdei essa forma de compreensão. A filosofia me transformou em um homem indagador, que coloca uma interrogação em quase tudo. Hesito em considerar isso necessariamente ruim, mas inevitavelmente gera alguns conflitos desconhecidos aos praticantes da fé cega. Porém, o ateísmo jamais esteve presente em minha jornada. Afastei-me da prática regular, mas continuo profundamente interessado naquilo que nos alça à transcendência. É impossível, do meu ponto de vista, distinguir o biológico e o que eventualmente sobreviverá à morte. Flerto com múltiplas crenças e tento extrair algo responsável por me conduzir para dias mais serenos, nutrindo-me desse sentimento tão vital aos seres humanos: a esperança.
Hoje tudo parece basear-se na produção e no consumo. Valemos pelas marcas visíveis deixadas no mundo. A consequência imediata é sermos afastados de uma eventual realidade que nos conduz ao anseio pelo divino, entendido aqui como um caminho de mistério ultrapassando a razão. Repito para mim mesmo a frase da teósofa Helena Blavatsky: “O finito não pode compreender o infinito.” Como alcançar o significado da palavra eternidade, por exemplo, se estamos submetidos ao tempo cronológico? É como se cada pessoa fosse um discreto riacho e Deus, ou qualquer entidade venerada pelas mais diversas seitas, do tamanho do mar. Por isso, essa questão permanece em aberto. Podemos, sim, dar o salto no escuro, como sugeriu o pensador Soren Kierkegaard. Com o que nos depararemos? É uma experiência única e intransmissível. Tenho curiosidade renovada e pretendo me manter distanciado de preconceitos. Orações, sutras, mantras, psicografias e demais manifestações do universo invisível sempre haverão de estar no foco da minha atenção. Quiçá na velhice eu me torne mais ou menos cético. É difícil saber apenas especulando.
Mantenho respeito pelas demonstrações de caráter místico. Nada sei, nada sei. Preciso manter-me receptivo. Considero arrogância o discurso inclinado a demonizar o que difere da nossa percepção esotérica. Exceto quando as igrejas se tornam holdings altamente lucrativas. Enfim, esse caminho pode ser profundamente solitário, mas com essa certeza: buscar já é encontrar.