Percebi que minha amiga não estava bem. Eu falava e recebia réplicas de discordância, em tom de renovada crítica. Ao me referir a questões de trabalho, meros detalhes se convertiam num campo de batalha verbal. Talvez em tempos passados, com a agressividade mais latente, teria insistido nesse jogo para destroçar os seus argumentos. Preferi escutar com calma, concordando com algumas coisas e retornando com suavidade, sem enfrentamento. Funcionou bem. Deveríamos ser capazes de fazer isso constantemente. Desarmar nossos interlocutores com delicadeza e aceitar atitude recíproca. O desejo de ter razão ou transformar as palavras em armas toda vez que alguém nos desafia em nossos conceitos e ideias é tóxico. Porém, a resposta imediata é a de rechaçar qualquer postura diversa da nossa. Afinal, acreditamo-nos evoluídos acima da média. Na maioria das vezes isso é desmentido pela própria realidade. É preciso tempo, paciência e boa dose de tolerância. E onde encontrar tudo isso nessa modernidade frenética, imbuída de propósitos de competitividade, propensos a ignorar intenções plurais? É um exercício difícil de ser feito, mas com resultados admiráveis.
Já fracassei muito nesse intento. Mal a pessoa esboçava uma contrariedade ou contrapunha minha fala com frases ásperas, meu propósito era o de sacar o melhor repertório discursivo, persuadindo o outro. Não vale a pena. Pouco sabemos do que se passa em mentes alheias e a expressão emocional é só a ponta de um iceberg formado de situações bem complexas ou mal resolvidas. Lembro ter sido bem interessante observar o comportamento dessa pessoa que admiro e quero bem. Se tivesse me entregado a um ímpeto para a satisfação do ego, perderia preciosa chance de ajudar a ambos, deixando de neutralizar a raiva impulsionadora da conversa. Alguns dias depois, ao visitá-la, refletimos sobre isso e chegamos à mesma conclusão: é ruim deixar fatos externos interferirem na qualidade de relacionamentos carregados de admiração mútua. Agir com rompantes é, em geral, abrir espaço para abrigar futuros arrependimentos. Quando injetamos adrenalina em nossas emoções, abdicamos da mansidão, entregando-nos a um jogo equivocado, sem chance de haver um vencedor.
Dar-se conta disso é o primeiro passo para ultrapassar um estado infantil de interação com os demais. Conter-se é um princípio filosófico e precisa ser posto em prática com bastante frequência. Ouvir, entender e, se necessário, calar – principalmente se desconhecemos em qual lado está a verdade. Nossas reações nem sempre são saudáveis. Se você tem a intenção de atravessar seus dias com leveza, aprenda a dar um passo para trás. E acolher com respeitoso silêncio o que costuma passar ao largo da nossa compreensão. Eis aqui um bom roteiro de vida.