Dos pecados capitais, a vaidade é provavelmente a que encontrou terreno fértil permanente no universo humano. A boa aparência tem a prerrogativa de bônus. Cultivar a própria imagem abre portas em um mundo inclinado a promover a adoração da beleza. Há aspectos bons e ruins decorrentes desse novo catecismo comportamental. Se olharmos fotografias de nossos avós aos sessenta, setenta anos, deparamo-nos com seres encarquilhados, de aspecto desleixado. Em comparação ao que vemos agora podemos até arriscar esta legenda: “Há pouco a esperar da vida, o fim se avizinha”. Hoje, ao contrário, a esmagadora maioria aparenta vitalidade e frescor, desconhecidos em praticamente toda a história no que chamamos de velhice. Com a ajuda da medicina e a mudança de paradigmas impostos pelo mercado, ostentam-se fisionomias transbordando vigor e ímpeto. Se pudéssemos encapsular numa frase a nova condição, poderia ser esta: estamos no páreo, ainda temos muito a fazer e contribuir. Aposentadoria? Apenas a chance de aumentar a renda, pois é praticamente certo o impulso de seguir ou recomeçar a carreira profissional. É claro, isso carrega em si aspectos louváveis, mas não pode ser impositivo. Lembro de um amigo me dizendo de seu temor em ter que continuar ativo sexualmente até o último dia. O Viagra (maravilha da ciência) roubou a possibilidade de adormecer o desejo quando a mente se desinteressar por essa prática.
Mas o emblemático mesmo passou a ser a obrigação de aparentar menos idade do que aquela registrada na certidão de nascimento. Sentimo-nos orgulhosos se alguém, em meio a determinada conversa, nos diz: “Meu Deus, você parece bem mais jovem!”. O peito se estufa de contentamento. Talvez seja a razão da dermatologia estar tão em alta: é preciso retocar, disfarçar, espichar, adiando ao máximo os efeitos maléficos do tempo. Sejamos sinceros: ninguém gosta de se olhar no espelho e se deparar com rugas, manchas, olheiras. É excelente termos à disposição grande arsenal de procedimentos e produtos nos ajudando a postergar o declínio físico. Porém, o perigo situa-se no exagero. Se estamos bem de saúde e a aptidão de produzir e se relacionar mantém-nos ativos, sigamos sem fazer tantas intervenções. Acho aflitiva essa ideia de correr alucinadamente contra o inevitável. Aceitar as limitações é uma atitude filosófica. Evita incontáveis sofrimentos. Cuidemo-nos, mantendo os pés no chão e o bom senso em alta. A juventude e o esplendor se esgotam, pois assim o determina a natureza. Mas sejamos sábios na busca do equilíbrio entre a constatação do inevitável e a luta em retardar a decrepitude.
A felicidade depende, fundamentalmente, de observar atentamente o que nos é entregue, embalada na constatação de sua fugacidade.
Não há química ou bisturi que a amplie em sua essência.