“Quem me dera aquela idade, sabendo o que sei hoje!”, diz a personagem do conto A segunda vida, de Machado de Assis. Desejo que permeia dez entre dez almas. Sonhamos todos, em algum momento, ter a vivacidade dos verdes anos, mas a experiência dos tempos de maturidade. Queremos o melhor dos dois mundos, ideal que não pode (e não deve) ser alcançado. Explica-se. Ao longo da trama, José Maria, que a protagoniza, vai tecendo considerações que tentam mostrar aos seus interlocutores como seria perfeita a existência que combinasse esses expedientes. Conversa com um, com outro e, ao encerrar a narrativa, descobre-se que o que nos está reservado, sem o ensaio prévio e a sabedoria acumulada, assim deverá permanecer. As razões são muitas e a mais plausível delas é que, aquinhoados pelo entendimento a priori, deixaríamos de nos entregar, por medo ou prudência, a grande número de experiências que, ao fim e ao cabo, se revelarão vitais para a construção da nossa personalidade. É o desconhecido, comprovadamente, que fornece o tempero, dando-lhe o gosto da expectativa, sem a qual tudo pareceria enfadonhamente repetitivo.
Pense comigo: qual é a graça de algo se o seu final já tiver sido revelado? O acúmulo de ações e sensações que vão sendo depositadas dentro de nós clamam por esquecimento. O fulgor da juventude pede aventura, risco. Mais velhos, sonhamos com o aquietamento, a pausa, certa lassidão. É a biologia se adiantando às emoções. Saber de antemão costuma até evitar certos erros, mas não nos permite a reflexão robusta sobre o que está acontecendo. Ignorar a continuidade dos enredos é pura benção. O oposto seria verdadeiro infortúnio a nos jogar contra os muros da desistência. Se a paixão é praticamente um castigo a que os hormônios nos submetem, por outro lado representa a capacidade de romper com a estabilidade, muitas vezes sinônimo de tédio. Então, esse afã de habitar o corpo na plenitude e uma mente saturada de aprendizado, só tende a resultar em frustração. É interessante perceber como o bruxo do Cosme Velho vai desencantando sua criatura, a ponto de estabelecer rascantes diálogos com o diabo. Este lhe mostra que o ideal que estava renegando se constitui no bem mais precioso.
Em outras palavras: a natureza faz e não cabe ao homem desfazer. Nada deve ser antecipado, sob o risco de embotar nossos olhos, incitando-nos a tomar decisões equivocadas. É preciso deixar fluir o amor e o ódio, a alegria e o sofrimento. Ainda sobre o ensinamento do texto: ser como os lírios do campo, disponíveis para a paisagem do agora. Resista a tentação de espiar o futuro. A única colheita desejável é a do presente, com seu dissabores e contentamentos.