Uma indústria da Serra, com mais de três décadas de atuação no mercado de chocolates, está cada vez mais em evidência. A DeCacau começou atuando com feiras de Páscoa dentro de indústrias de Caxias e hoje já está presente em mais de mil empresas da região Sul do Brasil. Nos últimos anos começou a investir em lojas próprias.
Com um forte planejamento de expansão, incluindo também projeto de franquias, a DeCacau vai construir uma nova fábrica em Gramado, o que vai dobrar a capacidade de produção nos próximos anos. Além disso, os empreendedores têm uma ideia ousada sobre o cacau para os turistas: reproduzir na Serra uma fazenda para mostrar a origem do chocolate.
Os irmãos Áureo e Andréia Romanzini são os diretores da marca. Ele cuida da parte comercial e produtiva. Ela da parte administrativa, de recursos humanos, fiscais, de estratégia e do financeiro. A seguir, confira a entrevista com os sócios:
Como moradores da região Uva e Vinho resolveram apostar no ramo de chocolates, mais associado à região das Hortênsias?
Áureo: A gente trabalha há 34 anos com chocolates. Eu trabalhava em Gramado, vendendo material de tintas para fábricas de móveis. Tinha o dono de uma fábrica de móveis de lá que também era dono de uma de chocolates. E aí a gente resolveu trazer para cá, para fazer Feira de Páscoa. O chocolate veio para a nossa veia. Depois começamos a trabalhar o ano todo com chocolates. E a Andreia veio trabalhar comigo quando o negócio cresceu, há 25 anos.
Andréia: Hoje atuamos com grandes empresas, colégios, prefeituras. Onde tem mais de 100 pessoas, nós atendemos.
Quando ocorreu a virada de chave para se tornarem também uma indústria?
Áureo: Em 2004, começamos a vender food, que é vender para pizzarias, doceiras e outras empresas. Isso nos deu esse know how para pensar em fabricar. Em 2012, o país sofreu um baque industrial, e essa empresa que nos fornecia sofreu com isso. Nós tínhamos dois caminhos: buscar outro fornecedor ou fazer a fábrica.
Andréia: E como já tínhamos todos os clientes embaixo do guarda-chuva, resolvemos montar a empresa. Para se enquadrar no conceito que tínhamos de atendimento, nós não íamos encontrar do dia para a noite um novo fornecedor.
Como ocorreu a montagem da indústria?
Áureo: A gente tomou essa atitude em junho de 2016. Falamos com o proprietário e compramos uma pequena parte da empresa e equipamentos que já existiam no mercado. Em 60 dias, montamos a fábrica em Flores da Cunha. Mas, para isso, foi preciso dar um passo para trás, reduzindo em quase 50% o chocolate vendido. Mas a ideia sempre foi retomar a produção. Atendemos os principais clientes e seguimos tocando o projeto. Passamos dificuldades, por montar uma fábrica tão rápido. Mas, passada a primeira Páscoa de 2017, as coisas foram andando, e começamos a desenvolver também o projeto da nossa própria matéria-prima.
Que chocolate é esse que vocês trabalham?
Áureo: Primeiro é preciso lembrar da vassoura-de-bruxa, praga dos anos 1980 que desestruturou o setor do cacau na Bahia. Com isso, as grandes moageiras importavam da África. Para tentar compensar, o processo do Brasil ficou muito rápido, e aí a qualidade da matéria-prima piorou. As moageiras corrigiam lá dentro. Mas isso perdia o sabor do cacau. É a mesma coisa que corrigir uma uva na elaboração de um vinho. Há 15 anos voltou a ideia de fazer um chocolate melhor, mas para isso se paga mais.
Andréia: Surgiram os produtores com certificação. Foi daí que surgiu a ideia do bean to bar, que acompanha o processo do grão de cacau à barra. São sementes de qualidade para transformação de chocolate de qualidade.
Áureo: Eu sabia que podia pagar um pouco mais se conseguisse pagar direto para o produtor e é isso que passamos a fazer. Fermentação e secagem são tudo no cacau e, para não perder propriedades, ele tem que fermentar no mínimo de 8 a 14 dias. Depois disso, eles nos mandam nibs de cacau (forma mais pura e menos processada), e aí a gente desenvolve o produto. Recebemos uma carreta de cacau por dia, pois somos uma das maiores empresas do Brasil que buscam direto na fonte. São 38 toneladas por mês de matéria-prima, derivadas do cacau. Além disso, a empresa desenvolve outros itens de chocolate, que gera uma produção total de 228 toneladas/mês.
Como surgiu a ideia de investir no varejo direto?
Andréia: Nós tínhamos projeto de expansão mas estava na gaveta pelo fluxo de trabalho e por conta da nossa capacidade fabril. Em 2020, quando anunciaram o fechamento de todo o comércio e indústrias, em 18 de março (2020), a gente viu o trabalho de todo o ano dedicado para a Páscoa desmoronando, porque foi na véspera. Estávamos com tudo distribuído. As lojas da Havan (um dos principais revendedores da marca na época) estavam fechando, as indústrias estavam cancelando feiras montadas. O Luciano Hang, dono da Havan, como um grande parceiro, viu nosso desespero e preocupado com a empresa e os colaboradores, nos convidou para uma Live e, juntos, divulgamos para o país que o momento de vender Páscoa era aquele. Com isso, conseguimos vender 30% da nossa produção e darmos a volta. Sobrou mais de 70% do estoque. Choramos por uma semana, mas resolvemos ir na contramão. Decidimos fazer diferente, uma reestruturação. Tínhamos mais de 70 funcionários que dependiam disso. O Áureo pegou estrategicamente a área de desenvolvimento de novos produtos e abrimos o leque. Lembro dele dizendo: vou voltar a ser vendedor e foi mesmo. E desengavetamos o projeto de lojas. Em vez de focar na indústria, resolvemos dar notoriedade para a marca, porque dentro das indústrias todo mundo conhecia, mas ninguém encontrava fora. Criamos um segmento diferente. Até se encontra hoje chocolate a granel, mas em barra pronta e ou retalhos. Aqui pode quebrar quanto quiser, levar a quantidade desejada. Treinamos equipes para proporcionar experiências. A Camila Santos (chocolatière da marca) desenvolveu produtos com sabores diferenciados. Quando abrimos a primeira loja da DeCacau em Caxias nos chamaram de loucos, porque era quando todo o varejo estava fechando. Agora já precisamos expandir. Como tínhamos parceria com a Havan, surgiu a oportunidade de abrir loja em Canela. Depois disso, surgiram projetos em mais 12 unidades que vão abrir neste ano, todas na Havan. Hoje temos 170 funcionários entre a indústria e o varejo. Mais do que dobrou o nosso quadro. E temos projeto de expansão para 2023, formatando um plano de franquias.
Por isso vão abrir uma nova fábrica em Gramado?
Áureo: Estamos para “bater o martelo” nesta semana no terreno. Pretendemos construir uma fábrica moderna. Já temos financiamento para os equipamentos. De 20 funcionários que temos hoje lá, vamos para cerca de 50. Toda matéria-prima nobre passará a ser produzida em Gramado. E isso nos dá folga para crescer em Flores da Cunha no segmento food. O projeto da fábrica de Gramado nasce junto com o turístico. Pelo nosso perfil de trabalhar com cacau de origem, queremos fazer uma mini fazenda de cacau se for possível. No dia 24, vou para Bahia ver se conseguimos trazer um produtor para fazer um projeto de produção aqui na Serra com estufas. Vamos ver se é viável... A nova planta deve ter em torno de dois mil metros quadrados. O projeto é, até 2024, produzir 400 toneladas por mês, o que significa dobrar a produção.
Andréia: De 2021 pra 2022, a já cresceu 64% para o food service. Vamos fechar 1,8 milhão de quilos neste segmento. Ao todo, são 2,7 milhões de quilos de chocolate fabricados por ano, para atender também o restante, que é Páscoa e agora o varejo.