Com 62 anos, Eduardo Slomp já acumula mais de quatro décadas de experiência no ramo supermercadista. Tanto que conviveu com administradores de grandes redes locais que marcaram a história de Caxias e que hoje já não estão mais em atuação.
Além de ser identificado por conduzir a rede Multimercados, é reconhecido por sua forte atuação sindical, desde a fundação do Sindicato do Comércio Varejista de Gêneros Alimentícios (Sindigêneros). Após oito anos no comando da entidade, Eduardo Slomp deixará a gestão no dia 1º de abril, mas seguirá na Fecomércio, onde é vice-presidente na área de gêneros alimentícios.
A seguir, o empresário do ramo supermercadista destaca o que o motiva a defender o setor, mesmo com tantos desafios, como os atuais provocados pela alta da inflação:
Como começou a tua experiência no ramo supermercadista?
A minha experiência começou com um conhecido dos caxienses. Logo depois que servi o quartel, em 1978, eu fui trabalhar em uma loja dele. O nome dele é Adiló Didomenico. Conhecem? Na época, ele era representante da Parmalat. Eu cuidava de um atacado que, no começo, ficava na Rua Vinte de Setembro, e depois foi para a Antônio Ribeiro Mendes no bairro Santa Catarina. Fiquei três ou quatro anos, e depois coloquei uma lancheria. Até que resolvi montar um atacado pequeno. Vendia na cidade com uma Kombizinha. Depois de dois anos, abri o supermercado em Forqueta. Já são 36 anos que estamos lá. Fui também um dos fundadores do Sindigêneros, porque antes ele era junto com o Sindilojas. Na época, tinha o Adiló, o Sergio Cesa, o Carlos Calcagnotto...
Você se considera, portanto, da velha guarda? O que ocorreu que muitos destes negócios não vingaram, enquanto o teu expandiu?
Amo Caxias. Conheço a história de todos os supermercados. O Calcagnotto começou na Sinimbu. Lembro quando o Pouco Preço veio. Hoje já se tem muitas empresas de fora. O que é bom para o consumidor, porque a concorrência é saudável. A gente aprende também, tenta se desenvolver para sobreviver. Na administração, o que ocorre com as marcas que fecham a gente chama de curva da barriga. Uma família coloca o negócio, consegue mantê-lo por anos, mas um dia mudam as pessoas da família, acham melhor vender, morar em outro país, trocar de cidade, e isso acontece bastante. O que me leva a gostar e permanecer é que supermercado é um ramo versátil. A gente aprendeu muito com a rede Multimercados. São 28 empresas familiares. Toda semana tem reunião. A gente acaba conhecendo até a família dos nossos colegas. É todo dia tentando melhorar a qualidade, serviço, o jeito de fazer. Há seis anos, em três colegas, nós colocamos os supermercados da rede Villagio. Hoje são quatro lojas em que a gente tenta melhorar todo o dia e, com isso, tu sentes o prazer em atuar. Sempre digo que o dinheiro é uma consequência do que se faz. Eu não penso em dinheiro, penso em fazer as coisas bem-feitas, e um dia ele vai acabar vindo. Primeiro eu faço e depois vejo resultado. Se quiser resultado antes, acabo colocando a carreta em frente aos bois, acabo fazendo empréstimos e coisas parecidas e acabo me perdendo no negócio. É muito importante começar pequeno e crescer. Nesse espaço de tempo, tu vais aprendendo em todos os sentidos, econômico, da sociedade, do jeito de viver.
Como foi atuar por oito anos seguidos no Sindigêneros e quais são teus planos futuros?
Participando do sindicato, onde fiquei por oito anos, construímos laços bem sólidos, contribuindo e atuando com nossos associados. O sindicato participa junto, e tive a oportunidade de defender o setor na Câmara dos Vereadores, com deputados estaduais, prefeitos e, muitas vezes, com o governador. Também temos em Porto Alegre uma entidade muito forte de que faço parte, que é a Fecomércio e que defende muito o varejo, tanto supermercados, como serviços, hotéis, e participo também do Senac. Eu acho muito importante tudo isso, e foi um prazer ter trabalhado no Sindigêneros. Continuarei em outras entidades, como a Fecomércio, e acho que lutando teremos um futuro bem melhor.
Qual o perfil do comércio supermercadista de Caxias hoje?
Ele ainda é do tempo dos primeiros empreendedores que colocavam os antigos armazéns, bem familiar. Começam com um pequeno balcão, vão crescendo, melhorando, e não costumam ter investimentos de fora. Essas lojas que estão chegando, sim, têm investimentos de grandes grupos, principalmente de Santa Catarina. O nosso comércio supermercadista caxiense é familiar e vai continuar sendo.
Como funciona a rede Multimercados?
No começo a gente achava que comprando em grande quantidade conseguia preços mais baratos. Isso não é verdade. A gente aprendeu que os preços são commodities. Hoje o açúcar e óleo de soja estão na bolsa de valores de Chicago. Então não adianta comprar mais. Mas e o resto além do açúcar? O resto tem açúcar também. As commodities comandam o mundo. Aprendemos que o que tem que fazer é melhorar o atendimento, as lojas e fazer ofertas juntos. Hoje a rede Multi tem oferta todo dia. O resto é sazonal, como compras na Ceasa, de fornecedores mais próximos. Trabalhamos juntos não só em promoções, mas para aprendizados, como sobre leis e impostos. O dinheiro gira muito rápido e para pouco com o supermercadista. O grande vilão são os impostos. Hoje eu fico na administração direta de seis unidades: o Croata em Farroupilha, o de Forqueta e quatro lojas em Caxias, que são os da rede Villagio. Tem mais as 28 lojas em que sou vice-presidente na rede. E temos as 532 unidades de supermercados de Caxias, São Marcos e Flores da Cunha que fazem parte do sindicato. Defendo todas em uma bandeira só. Não tem grande e pequeno, até acabamos defendendo mais o pequeno, porque o grande tem condições próprias.
Em termos de expansão da rede Multi, teremos uma nova loja no Centro de Caxias?
O Villagio vai trocar o endereço de uma loja no Centro, que estava com 230 metros quadrados, para uma com 700 metros quadrados. Para essa região da cidade, é uma operação de médio a grande porte. Ela deve ser inaugurada em abril. A rede investiu em torno de R$ 2 milhões. E a família Cesa, que é a dona do imóvel, investiu R$ 1,5 milhão. Por coincidência, é a mesma família que teve supermercados e que agora atua no ramo imobiliário. Aprendemos muito com Sérgio Cesa pela sua experiência. É uma referência, foi presidente da CIC, Sindigêneros, uma pessoa bem importante para negócios.
O que mais se fala no momento é de inflação e como vocês estão administrando os preços?
Um exemplo: o supermercado em si não tem despesa de logística. Quem tem é o fornecedor, e a gente depende dele. O custo da loja é igual para todos, fica em torno de 20%. Além disso, a gente tem o custo da mercadoria em si. Mas sempre estamos procurando segurar mais o preço do que a pessoa espera comprar. Por exemplo: o leite é sazonal. Nós vamos entrar o inverno depois de uma grande seca. Diminuiu muito o fornecimento de laticínios. Estávamos pagando em torno de R$ 2,50. Esse leite hoje já está a R$ 3,80, mas o supermercado estoca a mercadoria e faz o preço médio. Ele consegue segurar assim uns 15 a 20 dias. O supermercado não é o vilão, mas ele também tem um custo operacional. Assim como tem na casa de uma pessoa, com energia elétrica, água... O lucro vem depois de tudo isso, mas hoje estamos mais preocupados em poder só repor a mercadoria. Naquele dia em que sabemos que vai aumentar, compramos mais para, com o estoque, fazer que o cliente não sofra tanto. Nos obrigamos a fazer isso porque os clientes vêm todo dia, não é como um cliente que compra um carro na agência e fica anos sem aparecer novamente. Aqui tem gente que vem de manhã, tarde e noite. Então eu tenho que saber administrar o momento. Hoje sabemos que tem uma guerra depois da covid. A gente fica esperando que as coisas sempre melhorem, porque eu não posso ficar triste. Temos cinco empresas em uma, trabalhamos com desafios diários, como lidar com hortifrútis e outros bens perecíveis que podem estragar. Produzimos nas nossas padarias. Temos a venda, a cobrança, o cartão de crédito, são muitos negócios em um... Então a gente é que nem todo mundo, vive o dia a dia.
A inflação provoca retração de consumo e os supermercados acabam sendo um importante termômetro, certo?
Sim, provoca. A gente pode olhar a Rua Sinimbu, que mudou muito. Mesmo começando as aulas, não está tão movimentada. As pessoas mudam o jeito de comprar. Quando falei do guisado como termômetro, fui mal interpretado, mas ele é um exemplo porque é versátil. Com ele se pode fazer mil tipos de receita. Quando eu estou sem dinheiro, não peço um quilo, peço em gramas. Não é porque é comida de pobre ou rico, mas por ser versátil. E vemos que agora está vendendo bastante, porque é sinal de que as pessoas estão poupando. Assim como também notamos crescimento do consumo quando é injetado dinheiro pelo governo, como vai ocorrer agora com a antecipação do décimo terceiro para os aposentados, o que se reflete muito em supermercados. E em toda economia, porque aqui recebemos esse dinheiro e já distribuímos para cinco a sete mil empresas que fabricam os produtos que estão aqui.
Mas, mesmo com essas dificuldades, percebemos que os supermercados são um dos setores que mais movimentam a economia da cidade, inclusive com empregos.
Só na administração direta dos supermercados, tenho 237 funcionários. São 1.450 na rede Multi. São outros 7,5 mil profissionais da base do Sindigêneros. E hoje estamos com defasagem de cerca de 700 pessoas para atuar nos supermercados da região, para cargos como de repositor, caixa, açougue, padaria... Estamos procurando gente para trabalhar e não conseguimos. E o supermercado também passa por uma dificuldade a mais, pela questão do trabalho em fim de semana.