Jose Antonio Severo Martins, 59 anos, mais conhecido como Zeca Martins, é um dos nomes que mais se ouve falar em Caxias do Sul quando o assunto é novos negócios. Principalmente depois que foi um dos responsáveis por fazer rodar o primeiro caminhão elétrico do país e retomar uma marca automotiva histórica, a FNM. Além disso, está à frente de duas startups, uma na área de economia compartilhada voltada para fornecedores de indústrias, e outra no segmento de saúde.
Mas antes de ser empreendedor, Zeca teve passagens importantes em grandes empresas brasileiras e projetos governamentais. Não é difícil imaginar que ele tenha cumprido papel importante no setor automotivo, não só pelo sobrenome familiar na história da Marcopolo, mas também por estar liderando um projeto na área de mobilidade elétrica. O que talvez pouca gente saiba é que Zeca atuou por muitos anos cobrindo economia em grandes veículos de imprensa do país e ajudou a desenvolver políticas públicas na área de logística e atração de investimentos.
Qual a resposta para quando te perguntam se é caxiense?
Eu sempre brinco que sou nascido em Porto Alegre, criado em Caxias do Sul, com estágio em Caçapava do Sul, graduação no Rio de Janeiro e pós-graduação em Brasília. Morei nesses lugares todos, mas minha história em Caxias começou com a entrada do meu pai na Marcopolo em 1967. Nos mudamos para cá no final de 1968, quando eu tinha seis anos. Meu pai (José Antonio Fernandes Martins) foi o primeiro engenheiro contratado da Marcopolo (depois virou um dos principais acionistas). Como a família da minha mãe, Hieldis Martins, é de Caçapava, também morei um ano lá. Retornei e comecei a estudar Engenharia Mecânica, mas depois de três anos comecei a perceber que até gostava, mas não era minha praia. Em uma viagem de férias para o Rio de Janeiro para visitar meu tio José Antônio Severo (que morreu em setembro, aos 79 anos), ele estava convencendo o filho a fazer Jornalismo como ele. Ele não convenceu o filho, mas me encantou. Acabei fazendo vestibular e ficando por lá. Comecei como operador de VT na TV Bandeirantes. Pouco antes de me formar, eu consegui um emprego no Jornal do Brasil. Eu sempre cobri economia na minha vida como jornalista. Em 1990, consegui uma vaga no O Globo, em Brasília. Eu acompanhava o então Ministério da Fazenda. Depois o Estadão me convidou para trabalhar com eles. Quando a minha primeira filha estava para nascer, a Natália (Zeca também é pai de Thalita), decidimos voltar para o Rio de Janeiro e estavam oferecendo uma vaga na Folha de São Paulo, onde fiquei mais um tempo cobrindo a área econômica.
E foi no Rio de Janeiro que você teve uma passagem importante pela Marcopolo, certo?
Foi quando eu resolvi passar para o outro lado do balcão. A experiência que tive como jornalista sempre me ajudou e me ajuda até hoje. Tenho hábito de acordar cedo e ler jornais com informações que colaboram para o meu dia a dia e o meu futuro. É importante fazer boas conexões com essas informações porque se transformam em produtos que podem ter valor para ti. Na época que entrei na Marcopolo do Rio de Janeiro, comecei a estudar gestão, fiz especializações e fui me preparando para assumir papéis dentro da área de negócios. Depois disso, fui convidado para ser assessor do Ministério dos Transportes entre 1995 e 1997. Em seguida, a Marcopolo me convidou para voltar e auxiliar na área institucional, onde fiquei até 2005.
Como foi a tua volta para o Rio Grande do Sul?
Eu saí da Marcopolo porque entendi que tinha cumprido minha missão e resolvi trabalhar com o meu irmão Bebeto (Alberto Martins). Entre os negócios que empreendemos, trouxemos para Caxias uma especialização em gestão, mas foi bem em 2008, na época que estourou a crise. Aí, tive que buscar um emprego. Na época, estava sendo criada a Agência de Desenvolvimento e Promoção do Investimento (AGDI) e tive um convite para ser diretor de promoção comercial e atrações de investimentos. Muita coisa do que consigo fazer hoje foi a partir dessa experiência, principalmente na questão de relacionamentos. Pois tinha ficado 21 anos fora do Rio Grande do Sul. Voltei um ano antes de ser meio gaúcho, meio carioca, ou seja, voltei mais gaúcho. Poderia ter ficado em Porto Alegre, mas decidi voltar para Caxias, porque me sinto adotado por esta cidade. É o lugar que tenho um grande carinho. Dentro das minhas possibilidades, quero trabalhar para que ela fique melhor, uma cidade que tanto inova e que tanto faz diferente.
Tanto que foi em Caxias que surgiram as ideias dos novos negócios que você está empreendendo, como o primeiro caminhão elétrico a rodar no Brasil.
Quando voltei para Caxias, entrei em uma nova fase. Fui diretor executivo do Sindicato das Indústrias de Material Plástico do Nordeste Gaúcho (Simplás). Foi uma experiência que gostei muito, onde implementamos alguns projetos que impactaram a sociedade em geral, como na área de reciclagem. Quando saí do Simplás, comecei a estudar um pouco da inovação. Conheci um pouco disso na AGDI, mas eu buscava saber mais o que a empresa precisava para ficar no Estado, mas não mergulhava na inovação propriamente dita. Lembro de participar de um encontro do Trino Polo sobre Internet das Coisas em 2014, um ano muito ruim economicamente, que a gente não via luz no fim do túnel, e aquele encontro foi como se estivesse em um quarto escuro e alguém tivesse ligado uma luz para os negócios do futuro. E tive a sorte de as coisas acontecerem. Em 2018, cruzei com pessoas que vieram pedir opinião e, em uma conversa, já saímos com o modelo de negócio da Compra Comigo, primeira rede social B2B (business to business, empresas que fazem negócio com outras empresas) para compras colaborativas. Ainda estamos quebrando muitos paradigmas, o setor de supply chain (cadeia logística) ainda tem muitas estruturas estabelecidas que não querem mudanças, mas a Amazon levou mais de 20 anos para ter o primeiro lucro e hoje é uma das empresas mais valiosa do mundo. A história do primeiro caminhão elétrico começou ainda quando morava no Rio e conheci meu sócio, Ricardo Machado. Foi quando começamos a construir um carro, ainda a combustão, o Obvio 828. Em 2018, a Ambev, por meio de uma aceleradora, criou um edital para startups e apresentamos o projeto dos caminhões elétricos. Havia mais de 500 empresas e a nossa, a Fábrica Nacional de Mobilidades (FNM), foi uma das 10 aprovadas para ser acelerada. Eu, meu irmão e o Ricardo tratamos de trazer a fabricação para Caxias, porque não teria outro lugar no mundo que pudesse ter o mesmo resultado que tivemos, fazendo um caminhão que em quatro meses estava andando pela primeira vez. Em 17 de agosto, fomos até a Agrale, e nosso caminhão ainda era um monte de peças espalhadas pela fábrica, e no dia 24 de dezembro, como presente de Natal, o caminhão andou pela primeira vez. Em 12 de janeiro, apresentamos o protótipo para a Ambev e, em 21 de janeiro, eles fecharam o pedido de mil unidades.
Como estão os preparativos para a entrega das primeiras encomendas?
Agora o caminhão está em teste na rua, fazendo entregas na Ambev. Temos parceria também com a Randon e um diferencial é o nosso baú que encantou todo mundo, porque ele é bom, bonito, barato e vai ser mais produtivo, além de não requerer intervenção no chassi.
O teu mais novo projeto é uma startup na área da saúde. Como ela funciona?
A hygia bank surgiu porque nós temos uma operação familiar de medicina nucelar, a R2IBF. Meu irmão Bebeto é o CEO e meu pai atua no conselho. Em visita ao Vale do Silício, trouxemos uma ideia de modelo de negócio novo que é o hygiabank, pois nos propomos a ser um banco para a saúde. Mas queremos tratar da saúde, e não da doença. Hoje as pessoas têm planos para quando ficam doentes. A gente quer mudar esse foco, queremos prevenção e temos uma série de produtos para trazer melhores condições de saúde para as pessoas, oferecendo desde testes de DNA, como o nutricional, até educação financeira que também compromete a saúde quando está desorganizada. Também ofertamos educação em saúde, com o hygiahealth, e criamos o selo Working Health is Better, que tem como propósito trabalhar na saúde preventiva dos colaboradores para um diagnóstico geral. Trabalhamos com inteligência artificial, com muita tecnologia para propor mais saúde, o que deve resultar também em maior produtividade, menos afastamentos, mais integração de pessoas. A empresa tem um ano e meio. A ideia veio antes da pandemia, mas a covid-19 acelerou o processo imensamente. A celeridade é uma marca da hygia. Temos financiamentos liberados rapidamente com taxas possíveis de serem pagas para cirurgias, remédios caros e oferecemos seguros para doenças graves. Importante destacar que prezamos e incentivamos ao extremo a diversidade na hygia.