Pulo na piscina e mergulho num oceano. Que coisa sem nexo, dirão os pouca poesia. Sim, me preocupo com aqueles que endureceram e que mesmo debaixo da enxurrada da vida, não amolecem. Torrões de terra, algumas pessoas são assim. Pulo e me deixo levar pelo lembrar e o esquecer. A cada braçada deságuo águas outras que correm por mim. Rios perdidos de todos que vieram antes. Mergulho e suporto o silêncio submerso de penetrar em meus próprios afluentes. Filetes de trajetos aquosos de pessoas que sonhavam com vidas que nunca saberei. Ancestrais. Nossos ancestrais. Gente que aos poucos perde o nome. A piscina me é também como a água de um rio parado, lembranças. Nunca sabemos bem como é o fundo de rio. Dizem que os rios são traiçoeiros. Mesmo assim insistimos em pular neles. Alguns nunca mais voltam. Pulo em águas mais seguras, no entanto a metáfora não se altera. Lembro dos olhos de minha avó e de todo rio que sua íris continha. Ela é o ontem. Encontro com ela em meu envelhecer.
Meu pai que virou nuvem, achava água com uma varinha. Saía pelo pátio de quem o chamava e ia em silêncio, buscando as veias da terra. Eu seguia, em silêncio, ele pedia. Acompanhava seu rosto concentrado e seus passos lentos. Não sei que magia era aquela, mas de repente a varinha virava para cima e virava e teimava em suas mãos. Parecia criar vida. Ele dizia então, aqui tem água. E dizia ainda se tinha muita pedra no local e em que profundidade a água estaria. Meu pai era um poeta das profundezas. Nunca soube o que acontecia e ele não me sabia explicar, apenas me dizia, sente. Sentir o encontro com a matéria da qual também sou feita, sem medo e sem deixar a cabeça atrapalhar. A gente sente é no corpo. Enquanto escrevo lembro do verde no qual ele se metia em busca de águas subterrâneas. Às vezes, quando encontrava água, me chamava para ver, porque a essa altura eu estava envolvida com o sons que o mato faz, em busca de gotas de orvalho e nascentes possíveis de ver. E muitas vezes eu vi. Ver um rio nascer é presenciar a intimidade silenciosa do mundo. Meu pai dizia que eu era uma criança que tinha muito sol na cabeça. Então punha um copo cheio virado para baixo no topo de minha cabeça e dizia que a água era capaz de borbulhar de tanto sol que havia dentro de mim. Quando mergulho é ele que encontro e ele ficou preso no ontem.
Até hoje procuro nascentes, nas pessoas. A poesia é a minha varinha de procurar água nas gentes. Sento em silêncio e escuto as ressonâncias que me chegam de diferentes profundidades. Toda emoção vertida em lágrima é uma nascente e diante dela é preciso respeito e amor. Nossos sentimentos nos recolocam no cosmos. Bachelard nos diz que não podemos amar a vida se não colocamos nela amor, uma amizade que nos carregue de volta para a infância. Nossa alma não é surda aos sons que águas internas provocam.
Por isso, insisto. Nadar é não morrer afogada das águas que os olhos não podem conter.