Ele, ela. Tem te feito mal. Você sabe. As pessoas ao seu redor sabem. A conversa acabou. A intimidade ficou pesada demais. As diferenças se acentuaram. As brigas parecem não ter fim. Você está cansada de tentar entender. Nos últimos tempos ficar fora de casa tem sido a melhor opção. Ele está cheio de trabalho. Você está cheia de trabalho. Quando juntos, aquela sensação horrível de parecer estar pisando em ovos. Qualquer palavra pode desencadear uma discussão infinita. Talvez vocês já tenham faltado com o respeito um com o outro. Gritar. Ofender. Desqualificar. Às vezes, e quase sempre se chega a isso, violência física. Depois surge aquele silêncio culposo. O ar fica pesado demais. Você chora. Ele se afasta. Ficam sem se falar por um tempo. Então ele pede desculpas. Parece se dar conta de que está tudo errado. Promete que vai mudar. Que nunca mais vai acontecer. Você aceita as desculpas, mesmo sabendo que é a enésima vez que isso acontece. E, depois de três dias de paz, tudo, aos poucos recomeça. Aliás, isso tudo já se repete há tempos. Você sabe que é mentira. Que a pessoa não vai mudar. Não vai mudar. Você já se deu conta dessa repetição. Já percebeu que o outro te faz mal. Que você também faz mal para o outro. Já percebeu que vivem uma relação doente e que está adoecendo. Suas amigas já te avisaram que a coisa estragou. Você sabe que precisa sair antes de estragar junto. Mas você fica. E fica. E promete para si que vai sair fora, mas na verdade, você fica. E há anos você está onde está, sem conseguir se mover do lugar. A pergunta é: por que você fica, sabendo que este amor te faz mal?
Separar-se de alguém, mesmo que esse alguém te faça muito mal, não é fácil. É como se de repente você perdesse todo seu senso de orientação geográfica. Quando se vive demais em meio ao lodo, encontrar uma estrada asfaltada, causa vertigem. Um medo de cair, de ficar só, de estar fazendo a coisa errada, de se arrepender. Como se de certa forma, esse mal de amor te desse um lugar. Ou, a falta que a falta faz. Mesmo sendo um amor tapera, ir embora parece quase impossível. É estranho quando nos damos conta de que o medo de partir e ser infeliz é muito mais fantasioso que real. Afinal, você já é infeliz, só não reconhece. Reconhecer a infelicidade é doloroso demais. Talvez você pense que isso seja amar, se submeter ao desejo e aos destemperos do outro, quando na verdade, adoecemos quando nos submetemos.
Talvez você fique nesse mal de amor como forma de castigar o outro, por mais estranho que isso possa parecer. Um modo às avessas de se vingar da dor causada. Um padecimento ativo, porque ao mesmo tempo que padece, agride, silenciosamente. Depois de uma fala agressiva a frase se interrompe, pairando entre os dois. Uma luta insana, dentro e fora de vocês. Você sabe que precisa ir, você sabe, mas porque você fica?