O meu tempo é mais importante que o seu. Essa foi a toada da mensagem que consegui alcançar ao descobrir que o Whatsapp criou um botão que acelera nossos áudios. Um acossamento por meio do aumento da velocidade da fala do outro. Achei uma afronta sem tamanho. Algo da onipotência quase infantil, do tipo, fale logo que tenho mais o que fazer além de te ouvir. Uma intolerância ao tempo do outro, ao modo como o outro se coloca. Há aí também uma dificuldade de aceitar o outro dentro de seu próprio tempo e que ele tem todo o direito de realizar pausas mais longas, não encerrar frases e suspirar em meio as mensagens de áudio que recebemos. E eis que com a fala do outro, ouvimos dele as notícias e de nós, os afetos, afinal a ansiedade para que o áudio termine rápido é nossa, e não de quem nos mandou a mensagem. Isso corrobora aquilo que sempre se ouviu, sobre as etiquetas de Whatsapp, de que mandar áudio não é legal, o melhor é escrever, demonstra mais intelectualidade, mais apuro da língua e também porque não gera em nós a ânsia de saber o que o outro tem a nos dizer quando estamos impossibilitados de ouvi-lo naquele momento. Então sugerimos que ele mande escrito, assim saciamos nossa curiosidade e não temos o trabalho enfadado de ouvi-lo tossir ou gaguejar entre um parágrafo e outro. Assim abrimos mão deste parco recurso de encontro de corpos por meio da fala do outro pelas mensagens piegas do Whats. Estamos tão empobrecidos de contato que até a fala do outro, sua conversa, não cabem mais no nosso cotidiano. Então, agora isso: uma aceleração da fala do outro, porque nossa vida é tão agitada na nossa fantasia de sermos importantes que não dá para ouvir o outro no seu próprio ritmo, é preciso acelerar seu dito para que se possa continuar na bolha da própria ilusão de que o tempo de um é mais importante que o tempo do outro. Uma artimanha capitalista que outra vez mercantiliza o tempo. Afinal, tempo é dinheiro.
Na verdade, o tempo é um produto criado a partir de nossas entranhas e por meio de como a sociedade o recebe. Se somos pessoas sem tempo somos respeitados, afinal, estamos produzindo, realizando, capitalizando. Meu avô na sua infinita sabedoria fruto de um capitalismo selvagem dizia que quando não tivéssemos nada para fazer deveríamos carregar pedras. Assim, nasceram as taipas, onde eu, na infância, costumava me sentar para chupar uva e comer caqui. Não se indigne comigo pela minha vadiagem infantil e nem construa uma narrativa justificando que se eu estava comendo uma fruta ali era porque alguém um dia parou e fez, porque sabendo da criança que fui, pouco importava se havia ou não uma taipa, eu teria sentado no chão se fosse o caso. Sempre gostei foi de ouvir a história de como as pedras foram parar ali.
Ouvir o outro é emprestar-se, é não fazer questão de si mesmo o tempo todo, é abrir mão do egoísmo da autoimportância e permitir-se sair do centro, afinal, o umbigo é o início de tudo, mas ficar somente em volta dele é assinar nosso atestado de terraplanistas dos afetos.