A nova estação chega na flor que desabrocha, no canto dos pássaros que retornam para a casa do verão e na listinha de novos desejos para o ano que irá iniciar outra vez. Meço o tempo pela lua que passa altíssima, rasgando o céu. Há fases em que nos apresentamos mais iluminados e plenos e noutras, escuros e parciais. Somos gente. Somos terra. Somos abstração. Somos seres encurralados entre a partida e a chegada. Há sempre um ciclo que se encerra e outro que se inicia. Constantemente. Esta crônica é um texto de adeus, pois meu ciclo de estar aqui junto de vocês se encerra hoje, com 2016. Foram apenas quatro meses, durou o tempo que tinha de durar e saio cheia de recordações dos emails recebidos, das palavras de cumplicidade, do compartilhamento de sentimentos, de novas amizades e da sensação de sim, é preciso dizer sim, quase sempre.
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Em todo adeus há uma melancolia. Escrevo este texto como quem faz as malas, pois vai partir em uma longa viagem. Sempre esperamos voltar um dia. Há uma emoção em poder alçar vôos mais distantes, a certeza de ver outras paisagens e a humildade em reconhecer que a vida é muito maior do que qualquer ousadia. Por outro lado, enquanto organizamos os armários, liberando espaços para outros moradores, uma dor miúda, mas aguda, perfura o coração. Escrever é respirar e respiramos juntos nas últimas terças-feiras. Não nego a dor que me alcança, acolho e rego com atenção, há de brotar um roseiral dali, talvez lírios ou mesmo uma grama verde e viva. Não precisamos ser fortes o tempo inteiro, precisamos ser humanos, apenas isso.
Toco a escuridão da leitura de quem me lê e sussurro, não tenha medo. Enquanto vivermos em ciclos estamos vivendo e, me posiciono diante da vida, sólida e cheia de espanto, como um sol. Os dias nascem plenos de possibilidade de se fazer diferente, mas reserve instantes para estar entre flores e frutas. A terra nos ensina que somos matéria orgânica e que um dia tudo finda. Para não ter medo desses ciclos é preciso aceitar que temos subsolos e que é necessário visitá-lo de vez em quando.
Planto um pé de jasmim de poeta, o mesmo do início da publicação das crônicas em setembro, agora em outro espaço. Vou regá-lo, protegê-lo e deixar que desabroche quando for hora. Então me sento e espero. Enquanto observo o azul vejo o despertar de pássaros que cruzam em linha, em bando ou solitários o horizonte de expectativas. Partiremos, mas o que plantamos até aqui fala de como somos e das raízes que criamos. Como dizia Clarice, expandir-se é a própria alegria de viver. Obrigada.