Um encontro ao acaso, em Passo Fundo, foi o que fez das aulas do professor Rudimar Pedro, químico e mestre em Engenharia, tomar proporções inesperadas. Ao conversar com um imigrante senegalês morador do município, o profissional descobriu que ambos compartilhavam interesse por química. Pedro começou, então, a encaminhar materiais com conteúdos didáticos por e-mail.
Com o passar do tempo, a rede de contatos cresceu, e hoje, as aulas de Rudimar, que é professor da Atitus Educação, circulam por diversos países da comunidade lusófona, como Angola, Moçambique, Cabo Verde, Guiné-Bissau e Portugal.
— Não pensei que fosse tomar o volume que tomou. São centenas de professores e alunos que recebem meu material por WhatsApp e por e-mail. O intuito foi facilitar o acesso a aprendizagem de quem quiser — relata.
Desde 2018, o professor mantém uma página no Facebook, batizada de Quimicando com o prof. Rudimar, a qual ele abastece com vídeos de aulas práticas e conteúdos sobre química. A página acumula mais de 12 mil seguidores e a ideia é tornar a disciplina cada vez mais acessível e menos complicada, já que, ele reconhece, trata-se de uma matéria que as pessoas tendem a não gostar.
O professor já lecionou no Colégio Estadual Joaquim Fagundes dos Reis e conta que, pelo menos a cada quinze dias, incorporava uma aula prática em meio às teóricas. Foram mais de 500 em sete anos de trabalho na escola.
— Ninguém aguenta três horas de alguém falando na frente da classe, mas se forem slides dinâmicos e trabalho prático, os alunos vão gostar e vão entender. Mesmo quando a instituição não tinha os reagentes necessários, eu ia atrás e levava os materiais — conta.
Conhecimento compartilhado
Sanito Amado Jorge, de 25 anos, é um dos professores diretamente impactados pelo compartilhamento de conteúdos de Rudimar. Ele leciona na Escola Secundária Eduardo Mondlane, de Maputo, ao sul do país africano de Moçambique:
— Eu sou fã de rede social, então, conheci o trabalho do professor a partir da página no Facebook. Acessei e me direcionou ao WhatsApp e eu tive vários contatos com ele.
O educador planifica as aulas a partir dos materiais enviados pelo professor passo-fundense, de acordo com embasamento do programa da escola.
— Aqui em Moçambique temos problema de informações, de conteúdos, e quando se trata de uma área científica e vasta como a química, nós optamos por baixar conteúdos a partir do Google. Então, quando encontro alguém que facilite isso, tenho que agradecer bastante — acrescenta.
Sanito relata que nas aulas práticas do plano de estudo, as turmas precisam viajar cerca de 30 quilômetros com o carro da escola para chegar ao laboratório mais próximo. A realidade é semelhante para Jorge Tomás Kovie, diretor do Colégio Nº5 - Sambo, da província do Huambo, município de Caála, em Angola:
— Encontro dificuldade no trabalho relacionado com conteúdo de química. Então procuro sempre fazer buscas. Nosso principal problema é a falta de laboratório na área.
Trabalho transformador
Em 2020, durante a pandemia de covid-19, Rudimar transformou vodka em álcool gel para abastecer cooperativas de recicladores na cidade.
— Em janeiro daquele ano eu já desconfiava que ia faltar a matéria-prima do álcool gel, o carbopol. Fiz um alerta para termos ao menos dentro da instituição, mas já não se encontrava mais — relembra.
Em abril, a Receita Federal contatou a faculdade e ofereceu vodka apreendida. A obtenção do produto possibilitou a fabricação de cerca de 600 quilos de álcool gel, no laboratório da Atitus.
— Eu disse que faria o trabalho de forma gratuita, se o material fosse para as cooperativas de resíduos, que era um grupo problemático na época. Foram entregues quase mil frascos de gel e durou praticamente a pandemia toda — conclui Rudimar.