Algo que não se aprende, mas nasce como um dom: assim tradicionalistas descrevem a arte da trova e do repentismo, a habilidade de rimar em prosa e no improviso.
A prática é celebrada nesta quinta-feira (18), quando se comemora o Dia Nacional do Trovador. Em Passo Fundo, no norte gaúcho, Luizinho Araújo e Maria Edi acumulam centenas de prêmios e prestígio nas competições gaudérias.
O Dia Nacional do Trovador foi criado em homenagem a Luiz Otávio, pseudônimo de Gilson de Castro, fundador e presidente perpétuo da União Brasileira de Trovadores. Ele nasceu no Rio de Janeiro em 18 de julho de 1916 e foi quem propagou a trova pelo Brasil.
Qual a diferença entre trova e repentismo?
As duas modalidades são expressões populares, mas têm suas particularidades. Entenda quais são elas a seguir.
Trova
Embora todo trovador seja reconhecido como poeta, nem todos os poetas são trovadores. Na trova, é preciso dominar a arte da métrica de composição, que consiste em um poema de quatro versos em redondilha maior, com rima e sentido completo.
Repentismo
Aborda temas culturais, regionais e costumes populares. Tem destaque no sul do Brasil, onde os gaúchos desafiam-se mutuamente com versos improvisados em forma de poesia. Porém, em todo o país existem talentos que desenvolvem a trova com ritmos diferentes.
No Rio Grande do Sul, o Dia Estadual da Trova Gaúcha é comemorado em 4 de dezembro, em homenagem a Gildo de Freitas, considerado o “Rei do Repente”, e a Vitor Mateus Teixeira, o Teixeirinha, que, apesar de ser reconhecido como músico e cantor, também desenvolvia trovas.
Além de Gildo de Freitas e Teixeirinha, o Rio Grande do Sul também revelou outros trovadores históricos, como Moraezinho, Francisco Vargas e Pedro Ribeiro da Luz, que é natural de Passo Fundo.
Os trovadores de Passo Fundo
Com mais de mil troféus conquistados ao longo de 58 anos de história, Luiz Carlos Araújo, o Luizinho, de 73, é bicampeão estadual no repentismo. Nascido em Ibirubá em 31 de dezembro de 1950, ele mora em Passo Fundo há mais de 20 anos e deixou sua marca em praticamente todos os CTGs do município.
— Já deixei troféus por toda a cidade de Passo Fundo e sigo na atividade até hoje. No último final de semana, inclusive, participei da etapa regional do Enart em Marau. Apesar disso, ainda sinto que nossa arte não é valorizada como deveria. Isso é um dom de Deus: ou você nasce com o talento ou não nasce. É algo que não tem como ensinar! Então eu acho que a trova deveria ser mais valorizada, ainda mais na nossa região. Hoje trabalho como chapeador e também participo de outros eventos quando me contratam. A gente tem que se virar — afirmou.
Parceira de Luizinho em diversos campeonatos, Maria Edi Malaquias de Lima, 69 anos, é a única trovadora mulher em atividade no Rio Grande do Sul, ainda competindo em festivais e rodeios. Ela é natural de Soledade, mas mora em Passo Fundo há 48 anos.
Hoje no Departamento Tradicionalista do Clube Juvenil, Maria Edi conquistou a Medalha João Carlos de Moura e Trovadora Destaque com o Troféu Vitor Mateus Teixeira, além de ter se tornado vice-campeã no Enart.
Para manter a trova viva entre as novas gerações, Maria Edi faz apresentações em escolas a fim de apresentar a arte aos mais jovens.
— A família e a trova são minha vida! Espero que germinem as sementes que sempre fizemos questão de plantar nas escolas por onde cantamos todos os anos. Agradeço a parceria da minha amiga gaiteira Irondina Ferreira, que me acompanha nesse projeto, e a Clair (Gai Freitas, diretora do departamento de trova da 7ª Região Tradicionalista), que me acompanha por esse Rio Grande amado. Também agradeço a Deus, por ter me dado o dom — pontuou.
O dom dos trovadores é justamente a habilidade de transmitir valores e cultura através de versos. Mas para que tudo dê certo e o talento apareça na prática, é preciso dedicação e inspiração.
— Eu acompanho os trovadores há muitos anos e, às vezes, aquele que tira o primeiro lugar em um rodeio vai mal em outro festival, muito por causa do momento e da inspiração. Então, é algo que precisa ser reconhecido — disse Clair.
Recentemente, o departamento de trovadores da 7ª RT encontrou dois meninos com talento e interesse em manter a trova e repentismo vivos em Água Santa, município a 51 quilômetros de Passo Fundo.
— É um dom, mas sempre vamos tentar passar para as próximas gerações o que sabemos. Em uma região com tantos trovadores históricos, nossa missão é manter essa arte viva para sempre — pontuou Clair.