O acordo entre os poderes da República que disciplina emendas parlamentares representa um pequeno avanço de transparência no uso desses recursos públicos oriundos do orçamento da União e, portanto, dos impostos pagos pelos contribuintes. Há ainda muito o que aperfeiçoar nesse processo de moralização do uso político de dinheiro público para que tais destinações resultem em benefícios efetivos para a população — e não sirvam apenas para a promoção pessoal dos parlamentares em suas bases eleitorais. Mas o episódio recente, que chegou a provocar um princípio de conflito entre os poderes com ameaças de retaliação do Legislativo ao Judiciário, teve o mérito adicional de evidenciar o poder dos cidadãos para interferir no funcionamento da administração pública.
O bloqueio das emendas suspeitas não foi uma ação isolada do ministro Flávio Dino, posteriormente chancelada pelos demais integrantes da Corte Suprema. Foi, antes de tudo, o atendimento de uma demanda da sociedade
Foram ações movidas por entidades como a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) que levaram o Supremo Tribunal Federal a suspender temporariamente a farra das emendas, provocando o litígio e o acordo por mais transparência e correção no uso de verbas orçamentárias. .
É um exemplo claro de que os brasileiros precisam se habituar a fazer uso dos instrumentos democráticos disponíveis para fiscalizar e aperfeiçoar o funcionamento das instituições públicas. Não basta participar do processo de escolha de representantes, ainda que o voto seja o mecanismo mais visível e consequente para a seleção de governantes e agentes públicos efetivamente comprometidos com os interesses da população. Há vários outros caminhos para a participação popular na administração pública.
O primeiro deles é a busca de informação adequada sobre o funcionamento das instituições e sobre os serviços existentes. A Lei de Acesso à Informação, vigente desde maio de 2012, institui como princípio fundamental que o acesso à informação pública pelos cidadãos deve ser regra no país, sendo o sigilo somente uma exceção para casos bem definidos pela legislação. Como todos os poderes da República são obrigados a disponibilizar portais de transparência acessíveis à população, em todos os níveis da administração, os dois instrumentos podem ser utilizados pelos contribuintes para acompanhar gastos e investimentos de seus representantes.
Além disso, os órgãos de controle interno da administração pública, especialmente os tribunais de contas, também podem ser acionados pelos cidadãos para que exerçam o seu papel constitucional de fiscalizar a legalidade, a impessoalidade, a moralidade, a publicidade e a eficiência da máquina administrativa. Por fim, há o Judiciário como poder constitucional legitimado para controlar a legalidade de atos administrativos — como ocorreu agora por demanda de entidades organizadas para expressar o poder dos cidadãos de fiscalizar seus representantes políticos numa democracia sólida.