Ely José de Mattos, economista e professor da Escola de Negócios da PUCRS
Certa feita, ouvia um programa no rádio que noticiava um pedágio instalado em uma rodovia. Lá pelas tantas, um dos comunicadores argumenta: “Realmente, é ruim pagar pedágio, mas é o que precisa ser feito para se ter estradas melhores... o Estado não consegue dar conta”. Minha primeira reação foi discordar: com o tanto de imposto que eu pago, espero uma estrada decente. Uma cuia de mate depois, dei de ombros e concordei: melhor pagar mesmo, pois aquela estrada está terrível e o Estado não resolve. Pois bem...
Nos acostumamos a muito pouco. O serviço público esperado tem que ser aquele da melhor qualidade
Pensemos em outros setores. Na saúde, pelo SUS, temos um sistema de atenção universal, que oferece assistência gratuita. A expressão “pelo SUS” virou sinônimo do atendimento gratuito da população. No sentido figurado, no entanto, é uma representação das filas e da desesperança para uma série de tipos de atendimento. Em Porto Alegre, segundo a Secretaria de Saúde, há 6.759 pessoas aguardando consulta com oftalmologista; para uma colonoscopia, o tempo de espera é de quase nove anos – se for alta prioridade, pode-se conseguir em três anos.
Na educação, o Ensino Básico é gratuito também. No entanto, os resultados efetivos são desoladores. Segundo avaliação do governo do Estado, cerca de 66% dos estudantes têm concluído o Ensino Médio sem saber o mínimo aceitável em matemática. Nem sequer a estrutura física das escolas tem se mostrado minimamente adequada. Creches, que são imposição legal, também são escassas.
No entanto, não é incomum nos pegarmos relativizando. Não há quem não se impressione quando entra em uma sala de exame modernamente equipada e considere que é pelo SUS. Ou que espalhe aos ventos quando é bem atendido em uma UPA. Da mesma forma, escolas com bom desempenho viram notícia. E nos lembramos do filho daquele amigo que passou no vestibular saído da escola pública.
São exceções que deveriam ser regra. A qualidade média da entrega do Estado aos cidadãos é tão baixa que levou as expectativas junto. Já não esperamos ter uma escola de alta qualidade. A ideia de bom atendimento na saúde se resume a conseguir o exame antes que seja tarde demais. Comparar o serviço público com o privado já não é para termos simples referência.
Nos acostumamos a muito pouco. O serviço público esperado tem que ser aquele da melhor qualidade. Não existe qualquer razão para não esperarmos isso. A falta de entrega do Estado é motivo para cobrarmos e não para nos ajustarmos cada vez mais ao pior. Precisamos demandar nada menos do que a excelência!