Por Anthony Ling, arquiteto e urbanista, editor do Caos Planejado, plataforma digital sobre cidade
Boa parte do nosso espaço viário é dedicado para carros estacionados, um subsídio regressivo recebido por motoristas. Apenas na Gonçalo de Carvalho, a “rua mais bonita do mundo”, a renúncia fiscal é cerca de R$ 500 mil por ano, considerando a receita de cada vaga caso fosse cobrado seu valor de mercado para estacionar. Felizmente, algumas dessas vagas vêm sendo eliminadas para a implantação de ciclovias, executando nosso plano diretor cicloviário, que, infelizmente, pedala lentamente.
A retirada dos carros torna as fachadas mais visíveis e o aspecto visual mais agradável, atraindo pessoas
Uma das críticas é que a perda de vagas na rua prejudica o comércio, que frequentemente considera a via pública uma extensão do espaço privado para seus clientes estacionarem. Seria importante a coleta de dados para a comprovação deste efeito, pois, até o momento, múltiplos estudos em centros urbanos como Barcelona, San Francisco, Nova York e Melbourne mostram o oposto: um efeito positivo tanto no comércio quanto no valor imobiliário após projetos de humanização viária. Os motivos são vários. A rua se torna mais segura, efeito já identificado, por exemplo, na Avenida Benno Mentz, que teve uma redução drástica nos acidentes após a implantação, mesmo considerando o efeito da pandemia.
A retirada dos carros torna as fachadas mais visíveis e o aspecto visual mais agradável, atraindo pessoas. Mas o ponto mais relevante talvez seja que os carros na rua não só ocupam muito espaço, raramente representam clientes. Ou seja, carros são ocupados por motoristas únicos, que provavelmente estão fazendo outras tarefas no bairro – ou apenas usando a via como depósito para seu carro. A bicicleta, por outro lado, é quase imperceptível no espaço. Estudo na cidade de Portland indica que consumidores que vão às lojas de bicicleta gastam a mesma quantia que aqueles que vão de carro, fazendo compras menores, mas retornando com mais frequência (talvez por terem menos alternativas). “Mas são poucos ciclistas!”, dizem alguns. Continuarão sendo poucos se nosso plano cicloviário continuar nesta velocidade, com apenas 77 dos 495 quilômetros de faixas implantados desde 2009. Precisamos pedalar mais rápido.