Por Fábio Bernardi, sócio-diretor da HOC
O que mata o impresso não é o digital, é a irrelevância. New York Times, Washington Post e Financial Times, no jornalismo. One Show, Advertising Age e Archive, na propaganda. Fortune, Fast Company, The Economist e Harvard Business Review, nos negócios. Wallpaper e Monocle, no lifestyle. Wired, na tecnologia; Dazed&Confuzed, na cultura jovem; Condé Nast Traveler, nas viagens; Rolling Stone, na música; Vogue e Bazaar, na moda.
Se você pensar bem, em pleno mundo digital, as principais referências de vários setores da cultura, dos negócios e do comportamento ainda são impressas. E não é por acaso. O papel, apesar de tudo e de todos, sobrevive, não apenas pelo nosso hábito de folhear páginas, mas pela responsabilidade histórica de sua impressão. No digital, erra-se e corrige-se num clique. No impresso, é para sempre. Está contida nesta perenidade o segredo de sua permanência e de sua importância, mas também todo o peso de sua confecção. Seu esforço de critério e revisão, sua necessidade de beleza e design acessível, sua logística de distribuição, seu desafio de ser instigante, sua exigência de uma equipe colaborativa e disposta a um grande número de horas de trabalho para colocar algo impresso na rua, tudo isso pesa no custo, é claro, mas também pesa para sua relevância.
Se há uma mudança em curso, não me parece que seja o fim imediato do impresso
Por tudo isso, nunca é fácil imprimir um jornal, um livro, uma revista – e será cada vez mais difícil e custoso. Mas, também por isso, imprimir continua sendo quase um dever para quem valoriza ideias que podem mudar o mundo – ou, ao menos, um setor, um mercado, uma indústria. Que o digam os veículos citados acima, e todos os impressos que ainda são lançados todos os meses ao redor do mundo. Que o diga a venda de e-books, que não cresce significativamente como sempre se imaginou. A questão não é o impresso versus o digital, como querem os mais superficiais, mas a ressignificação do papel do primeiro em função da força do segundo.
Se há uma mudança em curso, não me parece que seja o fim imediato do impresso. O que muda é que, cada vez mais, não será a tiragem que os fará relevantes, nem mesmo só o nível do seu conteúdo, e sim a qualidade de quem os lê. Ainda mais num mundo em que a inteligência artificial vem aí para desafiar a capacidade crítica, analítica e criativa de editores, autores e leitores. Aliás, aquele autor, ensaísta, escritor, articulista ou qualquer referência cultural de que você gosta e na qual acredita, e que influencia o pensamento contemporâneo, já abandonou o papel? Aposto que não.