Gabriela Lotta – Professora de Administração Pública da Fundação Getulio Vargas
Entre os vários legados da pandemia de covid-19, um dos mais relevantes é nos mostrar a importância de termos um sistema de saúde público que garanta atendimento universal e gratuito à população. A pandemia recuperou um orgulho antes esquecido sobre o SUS, o Sistema Único de Saúde, que se mostrou resiliente e relevante mesmo diante do negacionismo do presidente e de todas as tentativas de sucatear o sistema e barrar políticas públicas consolidadas, como a de vacinação. Mas se este orgulho e relevância são hoje incontestáveis, também não restam dúvidas de que o SUS sai da pandemia e do governo Bolsonaro com muitas fragilidades que deverão ser enfrentadas pela próxima gestão.
Durante as últimas décadas, construímos um sistema de saúde com alta capilaridade e serviços de atenção primária e especializada que gerou efeitos marcantes na melhoria da qualidade de vida da população. O SUS existe em todo o país e é formado por milhares de profissionais e de equipamentos públicos que materializam o direito constitucional à saúde. E este direito precisa continuar sendo garantido, mas de forma mais ampla, equitativa e com qualidade.
A próxima gestão precisará encarar um desafio de reconstruir o que foi destruído nesta última gestão ao mesmo tempo em que deverá enfrentar problemas estruturais ainda não solucionados do SUS. A agenda dos próximos anos vai requerer um grande investimento não apenas financeiro, mas também de capacidade técnica e política. Esta agenda pressupõe retomar a centralidade da atenção primária e das políticas de prevenção e promoção à saúde, que foram parcialmente deixadas de lado durante a pandemia. Pressupõe reconstruir nosso Programa Nacional de Imunização, que já nos deu tanto orgulho. Pressupõe fortalecer as equipes de saúde da família garantindo a elas os recursos necessários – como medicamentos, por exemplo, em falta atualmente.
A agenda deve aproveitar o que aprendemos com a pandemia – como a importância de ações de prevenção e o uso da telemedicina – para mudar nossas rotinas. O SUS precisa dar um salto tecnológico, incluindo sistemas digitalizados e integrados, mas também um uso mais intensivo de tecnologias para realização de atendimento e contato com as famílias.
E para tudo isso, o SUS precisa de governantes preocupados com a população, que tenham a garantia do direito à saúde como central em seu governo. O SUS precisa de um governo que acredite que o bem-estar da população passa por políticas de saúde de qualidade, que respeitem nossas diversidades e enfrentem nossas desigualdades e que seja público e universal.
Este artigo foi escrito para a campanha #ciêncianaseleições, que celebra o Mês da Ciência.