Ao mesmo tempo em que 33 milhões de brasileiros vivem em insegurança alimentar, sem saber se terão todas as refeições do dia, um contingente ainda maior de crianças e adolescentes – cerca de 40 milhões, segundo a estatística oficial – só se alimenta adequadamente porque recebe merenda nas escolas públicas do país. Isso ocorre em um país que exporta alimentos e que tem potencial para suprir um sexto da população mundial, como assegurou recentemente o presidente Jair Bolsonaro em discurso na Assembleia Geral da ONU.
Neste Brasil de contrastes, o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), financiado conjuntamente pelo Ministério da Educação, pelos governos estaduais e pelas prefeituras, é a base de sustento para muitas famílias e também um exemplo para o mundo, ainda que não receba suficiente atenção de todos os setores responsáveis por seu funcionamento. Atualmente, por exemplo, há uma queixa generalizada contra a precária participação da União, que repassa apenas R$ 0,36 por dia para cada aluno do Ensino Fundamental, recurso incapaz de custear um copo de leite. Essa minguada contribuição faz com que Estados e municípios tenham que alocar percentuais maiores de recursos para oferecer café da manhã, almoço, lanche e café da tarde aos estudantes.
A merenda escolar não apenas funciona como fator de retenção e frequência escolar, mas também contribui decisivamente para o bom desempenho em aula
Na origem do problema, está a desatualização dos valores repassados pelo governo federal, que não acompanham a inflação nem recebem reajuste há cinco anos. O Congresso até tentou elevar a participação da União por meio da Lei de Diretrizes Orçamentárias, mas o Executivo vetou a medida considerando-a contrária ao interesse público. Além disso, as transferências do MEC para Estados e municípios vêm sofrendo gradativa redução devido à queda do número de matrículas.
A merenda escolar não apenas funciona como fator de retenção e frequência escolar, mas também contribui decisivamente para o bom desempenho em aula. A ciência demonstra que a alimentação inadequada reduz foco, memória e capacidade de raciocínio. Crianças desnutridas aprendem menos. Em contrapartida, alunos bem alimentados apresentam maior desenvolvimento cognitivo.
O país precisa de jovens saudáveis e bem-sucedidos nos estudos. Em entrevista publicada no caderno DOC da edição de final de semana, o ex-ministro da Agricultura Alysson Paolinelli, atual presidente-executivo da Associação Brasileira de Produtores de Milho (Abramilho), confirmou que o Brasil só se transformou em um grande produtor mundial porque soube conjugar tecnologia, ciência e inovação. Se não nos mantivermos atualizados, alertou, estaremos fadados a ser eternos compradores de alimentos.
O ciclo virtuoso de desenvolvimento de um país passa por três etapas conhecidas: conhecimento científico, tecnologia e inovação. O conhecimento, como se sabe, começa pela formação educacional adequada, dos estudos básicos ao ensino técnico ou superior, estágios só alcançados por indivíduos que recebem suficiente nutrição. Nesse contexto, o programa nacional de merenda escolar é uma política pública essencial e merecedora de total atenção das autoridades de todos os níveis.