Em uma democracia sólida, a Suprema Corte tem a palavra final nos grandes temas balizados pela Constituição. Cabe aos ministros iluminar interpretações e garantir as bases da segurança jurídica sobre as quais a sociedade evolui. Infelizmente, no Brasil, o ambiente de polarização política levou o Supremo Tribunal Federal a ingressar no perigoso pântano da disputa política cotidiana. Esse desvio não é bom para o país, que, envolto em uma crise sanitária com reflexos ao mesmo tempo capilarizados e profundos, precisa de sobriedade e harmonia.
Pelo preparo de seus integrantes e pela natureza da sua missão, o STF teria amplas condições de mudar a pauta do país, em vez de cair na armadilha da radicalização que, é bem verdade, não nasceu no Judiciário.
Observa-se em Brasília uma escalada de retaliações e ameaças envolvendo os poderes da República e seus líderes
Importante, nesse contexto, não confundir eventuais críticas a posturas do STF com as inaceitáveis tentativas de atentar contra a honra de seus ministros e as prerrogativas da corte. O que se espera é justamente o contrário disso: uma atuação independente, forte e focada nos reais interesses do Brasil, que passam longe dos factoides e das paranoias que inflamam os debates públicos cada mais violentos e emocionais.
Observa-se em Brasília uma escalada de retaliações e ameaças envolvendo os poderes da República e seus líderes. Já em 2018, antes do primeiro turno na eleição, Eduardo Bolsonaro, filho do futuro presidente, afirmou em um vídeo que, “se quiser fechar o STF [...] manda um soldado e um cabo". A partir daí, um clima de desconfiança impera na relação entre os poderes. Em três anos, nada foi feito para que as pesadas nuvens de tempestade se dissipassem, apesar da retórica pública tantas vezes ressaltar, em vão, palavras como “respeito e democracia”.
A História nos ensina que movimentos autoritários, invariavelmente, começam com ataques ao Judiciário e com a tentativa de subjugá-lo. Nesse momento, em que se vislumbram perspectivas sombrias no horizonte político da Pátria, espera-se mais de quem tem mais para dar. Por isso, os olhos dos brasileiros se voltam para o STF, na esperança de que as vaidades e os ódios pessoais cedam espaço para uma visão de futuro mais abrangente. O país precisa de mais STF, não de menos, e é esse o único sentido aceitável nas análises e pleitos dos que realmente prezam pelas liberdades coletiva e individual. Para tanto, é inadiável que o tribunal atue, cada vez mais, como um corpo único e não como o resultado do choque de individualidades, não apenas quando é atacado, mas principalmente quando propõe soluções e caminhos construídos com as inspirações e os limites impostos pelo marco que garante a coesão social e liberdade individual do país, a Constituição da República Federativa do Brasil.