Na próxima quarta-feira, completa um ano o primeiro caso do novo coronavírus no Rio Grande do Sul. Esta trágica efeméride, exatamente nos dias em que o Estado vive o período mais crítico da pandemia, abre a oportunidade para um balanço e uma série de reflexões sobre como a sociedade e o poder público reagiram a esse episódio, que ficará marcado para sempre na história do mundo.
Chegou a hora de os agentes públicos sensatos unirem esforços em busca de uma guinada na trajetória do Estado e do Brasil
É inevitável admitir o fracasso na contenção dos contágios, embora não seja um insucesso restrito ao Rio Grande do Sul, mas disseminado pelo país, pelo equivocado incentivo a uma divisão que criou a falsa dicotomia entre saúde e economia. Apesar de alertas e súplicas das autoridades responsáveis, não foi possível manter o distanciamento social nos níveis desejados, por uma profusão de razões, como negacionismo, a impossibilidade de isolamento da população que vive em condições precárias, a alta informalidade no trabalho e, por fim, o relaxamento e uma dose de egoísmo em aglomerações e festas clandestinas. O resultado não poderia ser pior: o Estado soma 13 mil mortes e foi inevitável reeditar restrições a atividades, com impacto negativo na economia.
Embora prevaleçam, não há apenas aspectos negativos a ressaltar. A pandemia desnudou ainda mais a desigualdade no país – e no Rio Grande do Sul –, mas ao mesmo tempo provocou o surgimento de uma onda irrefreável de solidariedade para amparar os mais necessitados que uniu empresas, entidades e cidadãos. Impelida pela necessidade, a tecnologia e a digitalização avançaram de forma poucas vezes vista em áreas como saúde, na própria economia e na educação, apesar de aqui, no ensino, também ter se formado um pesado passivo a ser recuperado. Graças ao esforço de um grande número de
cientistas espalhados pelo planeta, o mundo ganhou uma série de vacinas contra a covid-19 em tempo recorde. São a esperança palpável para o fim deste pesadelo global que, infelizmente, hoje açoita de forma drástica o Rio Grande do Sul. É o facho de luz em meio às trevas.
Além da solidariedade, o Estado viu surgirem milhares de heróis anônimos. São os profissionais de áreas essenciais como segurança, transportes e outros serviços de utilidade pública, mas principalmente da área da saúde. Submetidos a desgastantes jornadas e à exaustão de um ano na trincheira dos hospitais, dedicam-se diuturnamente para salvar vidas. Algumas dessas pessoas em funções mais proeminentes, talvez em um futuro não tão distante, serão devidamente reconhecidas e receberão justas homenagens pela dedicação e desprendimento. Sabem estar do lado certo da História, ao contrário de outras lideranças que se notabilizaram por agir na contramão das orientações científicas e, indiferentes ao sofrimento alheio, um dia talvez tenham de acertar as contas com a Justiça.
Ficam lições como a necessidade de olhar mais para a ciência como instrumento de desenvolvimento e de precaução para outras calamidades que possam vir e a urgência de se combater a vergonhosa desigualdade, que no Rio Grande do Sul é um pouco menor em relação à média brasileira, mas mesmo assim atinge níveis inaceitáveis. Mesmo desgastada, é a política, com a pressão e a participação da sociedade, que tem de dar as respostas e implementá-las. Chegou a hora de os agentes públicos sensatos unirem esforços em busca de uma guinada na trajetória do Estado e do Brasil. Se não for agora, em meio a este marcante e traumático episódio da humanidade, será quando?