Foi reiteradamente difundida nos últimos meses pelo governo federal e por apoiadores a versão de que pautas importantes para o país, como as reformas, deixaram de andar no Congresso por sabotagem do presidente da Câmara, Rodrigo Maia, adversário do Planalto. Há sérias dúvidas sobre a aderência desta tese à realidade, dada a repetida defesa de Maia da aprovação das mudanças na área tributária e administrativa, por exemplo, enquanto quase não se ouviu o presidente Jair Bolsonaro falar no assunto e, muito menos, demonstrar empenho para qualquer avanço. Mas o governo federal tem agora a grande chance de provar que os críticos do imobilismo do Executivo estavam errados.
Chegou a hora de o governo federal colocar enfim em prática a propalada intenção de levar adiante as reformas
Além do novo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), o Planalto passa a ter agora o aliado Arthur Lira (PP-AL) no comando da Câmara, uma candidatura que, literalmente, patrocinou com promessas de abundante distribuição de emendas e loteamento de cargos. Não poderá ser alegada, portanto, qualquer má vontade entre o Executivo e quem tem o poder de ditar a pauta. Há questões urgentes para serem tratadas, como o Orçamento 2021 e a busca por uma fórmula para criar uma nova versão do auxílio emergencial, sem que se extrapole o teto de gastos, mas o Planalto tem de ser célere em sinalizar ao Congresso e à sociedade a intenção de retomar a tramitação das reformas, para que os temas voltem a ser discutidos entre deputados e senadores. A pressa também é necessária pelo fato de 2022 ser um ano eleitoral, quando sempre é mais árduo caminhar com matérias controversas, impopulares e de difícil conciliação de interesses.
O próprio ministro da Economia, Paulo Guedes, disse ver Lira como o mais alinhado à agenda de reformas. Pode ser uma visão discutível, em função do pouco entusiasmo explicitado até agora pelo deputado com o tema. A dúvida também é alimentada pelo histórico do centrão – grupo antes repudiado e agora abraçado por Bolsonaro – de pressionar por aumento dos gastos públicos. De qualquer forma, cresce a responsabilidade do Planalto pela participação relevante na eleição de Lira.
Chegou a hora, portanto, de o governo federal colocar enfim em prática a propalada intenção de levar adiante as reformas. De arregaçar as mangas e mostrar serviço, contrariando a percepção de que a influência nas eleições do Congresso se resumiria à busca por salvaguardas pessoais. Não será surpresa se o centrão aumentar a fatura, em forma de verbas e cargos. Isso foi o que o grupo sempre fez, em todos os governos. Será a gestão Bolsonaro que terá de mudar a postura, demonstrando convicção e foco. Especialmente o próprio presidente. Caso contrário, se confirmará mais um estelionato e que o alegado boicote de Maia era apenas mais uma justificativa esfarrapada para a incapacidade de governar, a desarticulação e o desinteresse por reformas inadiáveis. As desculpas acabaram.