Até poderia ser espantosa a justificativa do líder do governo na Câmara sobre os motivos que segundo ele travam as reformas no Congresso se não fosse pronunciada por um prócer do centrão. Mas Ricardo Barros (PP-PR) apenas escancarou o modus operandi de seu grupo político ao sustentar que pautas essenciais para a saúde das finanças públicas no país e para destravar o crescimento deixam de avançar porque o governo não consegue fazer a contento o toma lá dá cá. Segundo o deputado, órgãos de controle como Ministério Público, Tribunal de Contas da União (TCU) e Controladoria-Geral da União (CGU) exageram no ativismo e trancam a liberação de verbas para obras indicadas por parlamentares, que assim ficam insatisfeitos e não votam com o Planalto. É o "apagão das canetas", batizou o deputado.
O que o Planalto tem demonstrado, ao contrário, é uma clara falta de interesse em levar adiante as reformas
A declaração de Barros lamentavelmente mostra que, para um número razoável de legisladores, à frente da tarefa inadiável de solucionar os graves entraves ao desenvolvimento do Brasil estão os seus interesses paroquiais, voltados a agradar a seus currais eleitorais. Isso não significa, ressalte-se, que essas obras ou projetos não tenham importância regional. Têm. Mas, no momento em que o país atravessa anos sucessivos de recessão e baixíssimo crescimento, com riscos fiscais iminentes, deveria existir um mínimo de espírito público e compreensão da encruzilhada em que o Brasil se encontra. Infelizmente prevalece o fisiologismo e a velha política que o presidente Jair Bolsonaro disse que enterraria, mas acabou sendo a sua boia salva-vidas quando sentiu-se acuado.
Barros é genuíno ao confirmar os verdadeiros interesses prioritários do centrão, ao pregar a troca de favores com dinheiro público com absoluta naturalidade, mas erra em outros dois pontos. O primeiro deles é a responsabilização de órgãos de controle, essenciais para fiscalizar a precisão técnica de projetos e o emprego correto de recursos que, no fim das contas, são dos cidadãos. Mesmo que existam burocracias que, com todo o cuidado, podem ser revisadas ou revogadas, as instituições alvo de Barros também fazem parte dos pilares da democracia brasileira e devem sempre estar atentas e atuantes para evitar malfeitos e prejuízos ao erário.
O segundo equívoco do deputado é quanto a um suposto interesse do governo em pautas como reforma administrativa, tributária e a PEC Emergencial, apenas para citar três dos temas mais importantes congelados no Congresso. O que o Planalto tem demonstrado, ao contrário, é uma clara falta de interesse em levar adiante as reformas. O próprio presidente Jair Bolsonaro, mais preocupado com assuntos comezinhos ou populistas, nem sequer toca no assunto e, de forma recorrente, se esquiva de decisões difíceis ou que supostamente poderiam tirar-lhe votos em 2022. Não bastasse o negacionismo ambiental e sobre a gravidade da pandemia, o governo parece também evitar encarar a inconveniente verdade da bomba-relógio fiscal. Não faltam desculpas para procrastinar. Fica sempre para uma eterna semana que vem. É uma paralisia que sairá cara para os brasileiros.