Nós últimos dias, o quadro institucional sofreu uma surpreendente deterioração com origem de onde menos se esperava: a Corte Suprema brasileira. Ao se arvorar no direito de abrir inquérito, investigar e julgar ao mesmo tempo, o Supremo Tribunal Federal (STF) concentrou uma escala inédita de poderes que, previsivelmente, levou ao atropelo do bom senso quando não dos próprios valores da democracia e da Constituição pela qual deveria ser o primeiro a zelar.
Ninguém ganha com o confronto entre STF e PGR, a não ser os que torcem pela derrocada do Estado de direito
O embate aberto entre a Procuradoria Geral da República (PGR) e o ministro Alexandre de Moraes é um fator de desestabilização. A questão torna-se ainda mais preocupante quando se leva em consideração as características dos outros poderes: um Congresso com largas bancadas dotadas da irresponsabilidade ou do exotismo e um Executivo povoado por bolsões que seguem um guru tresloucado, com influência a partir dos Estados Unidos.
No atual quadro de instabilidade, o pior que poderia acontecer é a Corte Suprema se desmoralizar em espasmos de autoritarismo. E, sem dúvida, é isso que ocorre com a absurda censura a um site e revista que entrará para a história como um dos mais desastrosos gestos contra a reputação do STF. A reportagem, que não indicava nenhum delito do presidente do STF, Dias Toffoli, e era virtualmente ignorada até o fim de semana, espalhou-se como fogo em palha após a censura e lançou uma nuvem sobre o Supremo. Não bastasse tal equívoco, seguiu o ministro determinando a caça a detratores da instância máxima de justiça, entre os quais um general da reserva que concorreu ao governo do Distrito Federal no ano passado.
É certo que as redes sociais se prestam para grosserias, ofensas e desinformação. Ainda assim, o caminho para neutralizá-las não é a violência ou a censura, mas a valorização da informação correta. E, se for o caso, a busca da reparação judicial baseada na ampla legislação vigente.
Ao dar eco às críticas de que age em causa própria, uma parte da Corte Suprema comete um atentado moral contra a instituição. Com isso, mancha injustamente a história de defesa das liberdades e das garantias constitucionais da ampla maioria de seus atuais e passados membros, além de constranger desnecessariamente o Poder Judiciário como um todo e abrir um abismo de desavenças com o Ministério Público. Ninguém ganha com o confronto entre STF e PGR, a não ser os delinquentes ou aqueles que torcem pela derrocada do Estado de direito e da democracia.