Por Carolina Hostyn Gralha, juíza do Trabalho e presidente da Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da IV Região (Amatra IV)
As declarações do presidente da República, Jair Bolsonaro, a respeito da existência da Justiça do Trabalho (ou o seu fim) geraram diversos debates, dividindo opiniões. Mas, para travarmos uma discussão franca e honesta, todos nós devemos nos despir das ideologias, dos preconceitos (seriam pré-conceitos?) e do corporativismo.
Não há como negar que é a Justiça do Trabalho que pacifica os conflitos decorrentes das relações sociais do trabalho, historicamente desiguais no nosso país, o que facilmente se constata pela atual estatística de que em 58% dos processos solucionados o que se pede é o pagamento de verbas rescisórias –ou seja, empregados que perdem seus postos de trabalho e não recebem sequer aviso prévio, férias, 13º salário e FGTS. De igual forma, é a Justiça do Trabalho que condena e cobra o empregador que deixa de cumprir a lei – sonegando não só direitos do trabalhador, mas também INSS, imposto de renda e outros tributos –, coibindo, assim, a concorrência desleal no mercado em relação ao empregador que observa rigorosamente a legislação. Aliás, há que se desmistificar a tão repetida falácia de que a Justiça do Trabalho é parcial em favor do trabalhador, pois nessa Justiça apenas 2% das ações são julgadas totalmente procedentes (o empregado ganha a causa), 12% são improcedentes (o empregado perde a causa) e 49% são solucionadas por acordo entre as partes (Dados TRT4 – 2017).
Poderíamos mencionar, também, as intensas atuações na prevenção e combate a trabalho infantil, trabalho escravo e mortes e doenças decorrentes das relações do trabalho.
Contudo, além de casos individuais, esta Justiça especializada contribui para melhorar a vida das pessoas. Recentes exemplos dão conta do quanto a atuação deste ramo influencia em toda a sociedade – como os casos das crises do transporte público em Pelotas e da saúde pública em Canoas –, situações em que os juízes do Trabalho agiram para que os serviços fossem regularizados sem maiores prejuízos a todos – trabalhadores, empregadores e população. É assim que a Justiça do Trabalho atua, sem lados, de forma mais eficiente, conciliadora e célere comparada a todos os demais ramos do Poder Judiciário, conforme dados do CNJ.
Extinguir a Justiça do Trabalho – que existe em diversos países, como a Alemanha e Israel – não levará ao desaparecimento dos conflitos. Eles persistirão, pois é a lei mais básica que é descumprida. A solução de encaminhar essas demandas à Justiça Comum – já assoberbada de processos – apenas retardará e tornará mais cara a solução dos processos, o que prejudicará trabalhador e empregador.
Desemprego se combate com investimento e desoneração da folha, por exemplo, e não com a extinção de uma Justiça que garante patamares mínimos de civilidade em uma sociedade justa e equilibrada.
As turbulências nos jogam para os lados extremos, mas há um caminho ao meio – de manutenção e aperfeiçoamento constante das estruturas eficientes – e este deve ser a nossa escolha.