Por Tatiana François Motta, economista
Há alguns anos, visitei a cidade holandesa de onde alguns de meus antepassados vieram. Chama-se Groede, pequena, parecia quase deserta, mas era limpa, charmosa e bem organizada, como imaginamos as cidades de países desenvolvidos. No passado não era bem assim. Pelo que sei, a família era pobre e provavelmente emigrou empurrada pela miséria, talvez pela perseguição religiosa. Parece que fingiram-se de alemães para poder embarcar em um navio que partia da Bélgica para o Brasil, com outros imigrantes. Devem ter passado por muitas dificuldades, mas sobreviveram, sobrevivemos. De outra parte da família, sabemos vagamente que eram de origem paulista, talvez bandeirantes, por alguma razão foram para a Argentina, e lá nasceu meu bisavô, que depois emigrou para o Brasil.
Essa é parte da história da minha família. Acredito que seja parecida com a de muitas outras famílias brasileiras. As histórias se repetem: fome, pobreza, perseguição política ou religiosa, medo, violência, ou alguma razão semelhante faz com que as pessoas abandonem sua casa, seu país, suas raízes e parte de sua família para viver em outro lugar. Imagino que para meus tataravós, recomeçar a vida em um novo país com idioma, cultura e clima tão diferentes deve ter sido extremamente difícil. Assim costuma ser para os que emigram. E a grande maioria só o faz porque não há alternativa possível.
Lembrei dessa história de família quando ouvi as notícias tristes sobre conflitos na fronteira do Brasil com a Venezuela. Houve outras notícias, de outros lugares, sobre confrontos, intolerância, violência. E há ainda o discurso agressivo de muitas pessoas contra os imigrantes. Claro que a imigração é um problema complexo, e as cidades que recebem os maiores fluxos enfrentam um enorme desafio, que só será superado com a implementação de uma política nacional, bem articulada entre estados, municípios e governo federal. No entanto, parte da solução pode estar em nós, através de um olhar mais tolerante e compassivo aos que chegam. Para isso talvez ajude pensarmos que, de certa forma, somos todos imigrantes.