Por Mauro Dorfman, publicitário
Deu na imprensa. O candidato a presidente em uma das principais coligações afirmou que não está preocupado com sua colocação nas pesquisas de intenção de voto porque, na visão dele, a campanha se inicia efetivamente com a largada do horário eleitoral. Essa declaração revela uma leitura muito pragmática e bastante dominante na política nacional: entre os muitos fatores que decidem quem serão os vencedores nas eleições majoritárias, a exposição nos meios eletrônicos, especialmente na televisão, é central.
É provável que você esteja consumindo cada vez mais vídeos online e outras formas de conteúdo. De fato, está muito comum, nas rodas e nas redes, um duplo questionamento: será que a televisão ainda é um meio tão importante? E, mesmo que seja, será que o programa político tem audiência suficiente para influenciar uma eleição?
A resposta à primeira pergunta pode surpreender, nestes tempos digitais e multimídia, mas é muito objetiva: a TV aberta reina absoluta entre os meios de comunicação, já que está presente em 97% dos lares e é o principal meio de informação e entretenimento declarado por 63% da população. A permanência média do brasileiro em frente à televisão aumentou para seis horas em 2017! Se você pensar que as pessoas estão passando mais tempo em casa em função do desemprego, da falta de grana e da insegurança, começa a fazer sentido. Por sinal, a audiência da TV paga despencou nesses últimos meses.
Mas essa multidão vai ver o programa do candidato? Ele e seus colegas políticos também têm essa dúvida. E tomaram uma providência muito inteligente. Eles reduziram pela metade a duração do horário eleitoral gratuito a partir deste ano. Em compensação, mais do que dobraram a quantidade de inserções que serão espalhadas pelos intervalos comerciais da programação. Tanto no rádio quanto na televisão, seremos expostos a 70 minutos diários fatiados em doses de 30 segundos. E não vale veicular de madrugada. Ou seja, o candidato e seus colegas terão muito mais exposição do que qualquer marca de refrigerante, carro ou banco neste período.
Agora considere o seguinte: a política e os políticos têm uma influência enorme na nossa vida. E até na nossa morte. No entanto, para a maioria dos brasileiros, a política não acontece no cotidiano da sociedade. Ela é uma atividade desenvolvida por especialistas muito bem remunerados. Como nos reality shows, assistimos pela TV ao que fazem esses profissionais. Criticamos seu desempenho. Sem grande envolvimento, vamos às urnas de dois em dois anos. E ainda temos o estranho impulso de votar em quem tem mais chance de ganhar. Como se a eleição fosse um jogo, uma corrida, essas coisas que vemos na televisão.
Por tudo isso, na hora de montar suas coligações, o candidato e seus colegas não consideram apenas ideias e projetos. Eles olham principalmente para minutos e segundos da sua audiência. O tempo de TV é a seiva vital do sistema eleitoral brasileiro. E o que define o tempo de TV de cada partido é o número de deputados federais. É um modelo que pode distorcer prioridades, já que estimula alianças de pura conveniência.
Claro que a televisão não é o único fator. Ela influencia, mas não decide. Muitos movimentos ocorrem na sociedade abaixo do radar dos especialistas. Apesar de tudo, vivemos numa democracia. Temos liberdade de expressão. E temos a possibilidade de pensar, debater, agir e evoluir. Por isso, nada está previamente definido. Ao contrário das séries da TV, nessa história são os personagens que escrevem o roteiro a cada cena. E as temporadas se sucedem sem fim. Não há possibilidade de cancelamento. Sejamos, portanto, menos espectadores e mais autores do nosso futuro.