Poucas horas depois da rejeição do pedido de habeas corpus do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pelo Supremo Tribunal Federal (STF), o juiz Sergio Moro decretou ontem a sua prisão. A peculiaridade de envolver um político que, de operário, chegou a ocupar por duas vezes o cargo de chefe do Executivo, faz com que a repercussão do caso seja inevitável. O Brasil, porém, não vai acabar por causa disso. O país mantém a rotina justamente porque suas instituições, como vêm reafirmando agora, seguem determinadas a enfrentar desafios, cumprindo seu papel constitucional.
No caso específico, essa capacidade de dar respostas se manteve, apesar das pressões por parte de interesses antagônicos em relação aos fatos envolvidos. Isso ajuda a explicar os cuidados especiais determinados pelo juiz responsável pela Lava-Jato em Curitiba, ao permitir que o político petista se apresente até hoje à Polícia Federal no Paraná, sem o uso de algemas e com o direito de ficar em uma sala especial, longe de outros presos, para preservar sua dignidade.
Apesar da comoção e da polêmica em torno dos fatos que culminaram com a prisão, não há motivos nem para comemorações por parte de opositores ao político petista, nem para reações contrárias à decisão judicial. Excessos como os defendidos por um líder do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) logo após a decisão dos ministros do Supremo, por exemplo, são incompatíveis com o que se espera numa democracia.
Condenado a 12 anos e um mês de prisão pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso do triplex de Guarujá, o líder petista enfrenta agora apenas o primeiro processo do qual é alvo, pois há outros na fila, à sua espera. Não é também o primeiro político e provavelmente não será o último a ir para a cadeia no âmbito da Lava-Jato. Ao contrário do que demonstram os discursos de seguidores, sua prisão sequer tem condições de impactar o quadro eleitoral. Ninguém tem dúvida de que o ex-presidente já é considerado inelegível diante das exigências da Lei da Ficha Limpa.
Ao mesmo tempo, é uma miragem o discurso distorcido de aliados do líder político de que a Constituição foi rasgada com a rejeição do pedido de habeas corpus que permitiu sua prisão, pois aconteceu o contrário. O que permitiu o combate à corrupção no país atingir o atual estágio é justamente a particularidade de estar ocorrendo dentro do cumprimento estrito à Constituição.