Impensável imaginar uma cadeia que precise ser protegida dos bandidos mais perigosos. Ela existe e fica em Canoas. Atende pelo pomposo nome de complexo prisional e se diferencia das demais porque não recebe detentos ligados a facções criminosas.
É compreensível e até justificável a posição das autoridades. De nada adiantaria inaugurarem-se dezenas de novas celas se a cultura apodrecida que impera nos presídios brasileiros fosse ali reproduzida. A realidade é amplamente conhecida. O loteamento das galerias entre as facções é um salvo - conduto para que o cumprimento da pena se transforme em plataforma de operações criminosas. A expressão virou clichê e, por isso, perdeu muito da sua força original: a cadeia virou a universidade do crime. É preciso colocar um ponto final e iniciar um novo parágrafo.
Canoas é uma experiência que deu certo porque suas instalações foram blindadas e nelas não ingressaram justamente os bandidos mais perigosos, os que comandam, de dentro para fora, o tráfico, o roubo e a execução de rivais e de inocentes. Por isso, em ano de eleição, é grande a tentação de empilhar presos nas novas unidades, que devem ser inauguradas nos próximos dias. É preciso ter cuidado. Não se pode comprometer o modelo que funciona, em nome de interesses imediatos.
O sucesso de Canoas expõe ainda mais o tamanho do problema que falta resolver. Até agora, são tímidos e insuficientes os esforços para romper com o poder paralelo que, por fraqueza do Estado, se instalou nos maiores presídios gaúchos.
A inauguração das novas etapas da obra em Canoas é uma boa notícia. Apesar do atraso, deve ser comemorada. Mas não pode eclipsar o debate sobre o passivo que alimenta de forma decisiva o ciclo da violência que transformou Porto Alegre e as maiores cidades gaúchas em locais inseguros.
É bom saber que existe uma cadeia no Rio Grande do Sul onde os condenados cumprem suas penas de forma rigorosa, mas não precisam pagar mais do que devem. São submetidos à autoridade do Estado, mas têm alimentação, higiene e dignidade para buscar a reabilitação.
O próximo passo é o mais complicado. Precisa de dinheiro, coragem e muita força. Transformar o resto do Rio Grande em Canoas é um desafio. Mas, mais cedo ou mais tarde, terá de ser enfrentado.