* Ortopedista
Apesar das dimensões inusitadas da crise brasileira atual, a classe média brasileira se mantém inerte e acovardada. As denúncias diárias de conchavos políticos repugnantes, de desvios bilionários e fraudes vergonhosas, não conseguem motivar uma mobilização capaz de traduzir a mínima insatisfação desse importante segmento da sociedade brasileira. Conceituados formadores de opinião têm cobrado uma participação mais ativa da classe média como um instrumento de mudança contra a amoralidade reinante, mas esquecem de analisar o porquê desta indiferença contagiosa.
Explorada por uma máquina governamental hipertrofiada e onipresente, a classe média trabalha cinco meses ao ano para pagar impostos. Esse garrote apertado, gradual e lentamente, ensinou-a a viver com fôlego curto, abstendo-se de movimentos bruscos e exagerados que possam lhe exigir grandes golfadas de ar. Não bastasse essa restrição econômica, vive o pesadelo da perda do seu emprego. Como sair para uma manifestação durante o horário de trabalho correndo o risco de tornar-se mais um entre os milhões de desempregados que hoje se desesperam pelo Brasil afora? Isso só é possível sob o guarda-chuva de um partido ou sindicato.
Além disso, desde o plebiscito do desarmamento, seguido de várias importantes petições públicas sustentadas por milhões de assinaturas, ficou claro que o Legislativo e o Executivo brasileiro não dão a mínima para a opinião pública, distorcendo todos os projetos que lhes são entregues. Diferentemente de outras classes sociais que querem atingir suas metas a qualquer preço, a classe média não quer se arriscar porque pensa que ainda tem a perder, sem se dar conta que há muito tempo deixou de ter segurança, passando à condição de caça para toda sorte de predadores urbanos.
Há muito tempo deixou de ter saúde, passando a gastar boa parte do seu salário com planos de cobertura particulares. Há muito tempo deixou de ter educação de qualidade, trocada pela abertura de uma infinidade de cursos superiores sem adequadas condições técnicas. Por fim, como protestar se há muito tempo deixou de saber em quem acreditar?