Todos conhecem o personagem bíblico que virou alvo de uma tradição religiosa no Sábado de Aleluia, a Malhação de Judas. A história diz que ele deveria ser surrado e queimado. Com o tempo, o traidor foi substituído pelo rosto de políticos e personalidades não gratas naquele momento para a sociedade. Uma prática antiga que ainda vigora em muitos locais, inclusive, aqui no Brasil. Mas eu quero falar sobre uma nova "malhação do Judas" que tem se espalhado por grandes cidades brasileiras, todos os dias. Infelizmente, o novo alvo escolhido para esta catarse pública não é mais apenas um símbolo de pano, mas sim um importante componente de nossa vida cotidiana: o ônibus.
Ainda que o transporte coletivo receba críticas, ele está longe de ser um vilão. Pelo contrário, é nosso modal mais utilizado, cumprindo um papel fundamental na mobilidade urbana que, quando não opera, causa transtornos enormes à população. Pois bem, como explicar que quase diariamente tenhamos ônibus queimados ou depredados? Manifestações políticas, protestos, ações do crime organizado, greves, jogos de futebol e outros diversos motivos hoje são catalisadores para a queima e quebra de ônibus. Pior, estes atos de selvageria muitas vezes são cometidos com pessoas no interior do veículo. No Rio de Janeiro, tivemos recentemente a morte de uma pessoa com deficiência física que não conseguiu sair a tempo de escapar do ato de barbárie.
Ainda que o transporte coletivo receba críticas, ele está longe de ser um vilão
A conta por um ônibus queimado é paga por toda a sociedade, do empresário ao passageiro, e o custo não é apenas o financeiro. Quando um ônibus é vandalizado, o trabalhador, o idoso, o estudante e os demais usuários ficam sem aquele veículo, piorando a qualidade do transporte. No caso da queima, temos a suspensão do atendimento da linha, parcial ou totalmente, prejudicando o planejamento da operação do transporte com efeitos ainda mais graves. O ônibus é o transporte coletivo mais acessível, é um símbolo da utilização do espaço público de forma democrática, um exemplo de civilização e convívio, de respeito ao próximo e ao seu semelhante, que independente da cor, credo ou convicção política, time de futebol ou discordâncias dos rumos da política, deve ser respeitado e cuidado por todos.