* Professor universitário e escritor
Graças à indignação de parte significativa da população brasileira com a forma como a política tem sido usada para manipular, para usurpar, para mentir, para defender interesses particulares, para ofender os adversários, podemos perceber que aquilo que denominamos de democracia não é bem o que estamos vivendo atualmente.
Digo isto olhando tanto para os cenários nacional, estadual, municipal e mesmo nos demais âmbitos em que acontecem eleições. A maneira como têm ocorrido os processos eleitorais são um excelente parâmetro para aferirmos a qualidade de nossa democracia. Fica uma primeira pergunta: não estaríamos, então, vivendo numa democracia? Viver em democracia pressupõe alguns requisitos que considero fundamentais. Quais sejam: desejo de coexistir e conviver; respeito por si próprio; honestidade; mútuo respeito; colaboração; equidade; ética social e um conversar reflexivo. Se qualquer um desses quesitos não estiver presente, todos os demais perdem sentido, pois são interdependentes. Ao perdê-los, se inviabiliza a experiência da convivência democrática. Isso se deve ao fato de que a convivência democrática é como uma obra de arte. Uma obra de arte que se faz no viver e conviver humano pela emoção íntima do cooperar, do respeito mútuo, da honestidade, enfim, no desejo de coexistir numa convivência pautada pela emoção do amor pelo outro. E aqui vale salientar: amor como a emoção que só acontece numa relação de total confiança no outro e sem exigências de qualquer tipo. Ou isto, ou estamos falando de qualquer outra coisa menos de amor. Amor como a emoção fundante do humano. Ressalte-se, também, aos menos avisados, que aqui não estou me referindo ao amor romântico que se lê nos livros e filmes. Amor, esse – dos livros de romances –, que tem grande valor para a ampliação das consciências de quem os lê. Mas que não é a ele que estou aqui me referindo.
A convivência democrática, como essa obra de arte a ser construída por todos aqueles(as) que acreditam na democracia acontece, portanto, no âmbito das relações humanas. Desde que essas relações ocorram num espaço de convivência responsável e por meio de um desejo sincero e honesto de convivência no respeito mútuo e na vontade de viver e conviver sem ódios, sem verdades, sem manipulações. Última pergunta: que exemplo de viver democrático estamos dando para as crianças e jovens de nosso país, nosso Estado, nossas cidades, nossas universidades. É o que estamos fazendo e, principalmente, a forma como estamos fazendo agora, que servirá de base para um viver e conviver democrático no futuro. Democracia não é um conceito. Não é algo "em si". Democracia é um modo de conviver e de coexistência harmônica com o outro. Simples assim.