* Economista
Eu sei que essa violência nos amedronta, essa corrupção nos desorienta, que a impunidade nos revolta. Sei que dá vontade de tomar uma atitude, drástica e definitiva. Até dá para entender os que aplaudiram a notícia do rapaz que foi tatuado na testa após ser acusado de roubo. Porque dá vontade de tatuar na testa de muita gente: "ladrão", "corrupto", "assassino". Somos humanos e estamos com medo. Nossa reação contra o que nos ameaça pode ser violenta. No entanto, na ânsia de corrigir os erros, corremos o risco de ficar cegos para a humanidade que existe em cada um, por piores que sejam suas ações. Corremos o risco de perder a nossa própria humanidade.
E que tal se cada um trouxesse marcado no rosto seu delito ou defeito? Saberíamos de cara quem é desonesto, irresponsável, perigoso. Saberíamos em quem confiar. Um adolescente que tivesse sido pego roubando um chocolate no supermercado seria sempre conhecido como "ladrão". Quem brigou na rua após beber demais, "violento". Quem quebrou garrafas e chutou lixeiras na saída de uma festa, "marginal". Enfim, carregaríamos sempre conosco o peso dos nossos erros e fraquezas. Seria fácil identificar quem presta e quem não presta. Mas não seria fácil mudar. Quem traz tatuado na testa o estigma de um erro, vai ter dificuldade em ser uma pessoa diferente e melhor.
Quase todo mundo tem razões para sentir a raiva, a tristeza e a indignação com o rumo da nossa sociedade. Apesar disso, eu sei, e muita gente sabe, lá no fundo, que torturar o ladrão, surrar o assaltante, humilhar o corrupto, não resolve o problema. Talvez, para algumas pessoas, reagir assim possa trazer algum conforto temporário, mas não acredito que funcione como uma política de justiça e segurança. É provável que o melhor ainda seja confiar nas leis e nas instituições, e confiar na capacidade de regeneração das pessoas. Sugiro que antes de decidirmos tatuar definições na testa de cada um, ou apoiar essa atitude, pensemos bem na sociedade que queremos construir.