O longo depoimento na condição de réu do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao juiz Sergio Moro serviu antes de mais nada para reafirmar que, acima dos interesses políticos, as instituições democráticas cumprem com o seu papel. Só numa democracia, observados os limites da lei e da ordem, manifestantes com diferentes pontos de vista sobre o que está sendo decidido em âmbito judicial saem livremente às ruas para expor o que pensam. E só uma democracia consegue assegurar que nem mesmo pressões de toda ordem, como as registradas ontem, possam cercear o amplo direito à defesa ou intimidar o Judiciário. Com a mobilização de um esquema de segurança em que até mesmo as Forças Armadas estiveram de prontidão para assegurar normalidade a mais essa etapa do processo, Curitiba demonstrou isso na prática.
Sob o ponto de vista do ex-presidente, é natural que todos os esforços sejam no sentido de evitar o impacto de uma eventual condenação em primeira e segunda instâncias sobre seus planos políticos para 2018, nesse que é o mais adiantado dos processos que têm pela frente. O fato concreto, disponível em vídeo, é que um dos mais populares líderes políticos do país enfrentou o constrangimento de revidar em juízo a acusação de ser beneficiário de um apartamento triplex em Guarujá, no âmbito da Operação Lava-Jato. A insistência em responder nas ruas ao que deveria ficar restrito ao âmbito judicial só faz sentido entre admiradores. Ao mesmo tempo, reforça a impressão de que faltam argumentos por parte da defesa.
O que o país conseguiu demonstrar ontem, em Curitiba, é a capacidade de respeitar o direito à livre manifestação, sem que o Judiciário se deixe intimidar por pressões. Foi o que ficou evidente com a decisão de diferentes instâncias judiciais de barrar tentativas de interferência na forma como seria realizada a audiência e até mesmo a tentativa de protelá-la. Postergar esse caso só pode interessar a quem teme ver o ex-presidente inelegível.
Com seus erros e excessos, que vêm sendo corrigidos no decorrer do processo, a Operação Lava-Jato é vista por um contingente expressivo de brasileiros como um alento no combate à corrupção. Curitiba, transformada em palco de manifestações, tornou-se uma espécie de símbolo dessa causa. Ainda que as manifestações possam ser consideradas excessivas e mesmo despropositadas, o que os brasileiros presenciaram ontem fortalece a democracia e a crença na perspectiva de um país mais justo, com menos impunidade.