Dos 513 deputados federais apenas 39 foram alvo de abertura de inquérito determinado pelo ministro Edson Fachin com base na delação da Odebrecht. Ou seja, menos de 10%.
Assim sendo, a situação não é tão desesperadora como parece. A sensação de caos total na vida pública se deve em parte aos fatos graves descobertos e em parte a generalização maniqueísta que afirma, repete e carimba todos os políticos como sendo malfeitores.
O Ministério Público irá atrás de provas sobre os investigados. Só então saberemos quais serão denunciados. Os ministros do Supremo irão ou não aceitar as denúncias. As que forem aceitas tornarão réus os investigados. Ao final de tudo, é possível que nem todos os 39 deputados federais sejam considerados criminosos. Mas para a opinião pública dominante todos já são. E não só os 39 citados, todos os 513.
O maniqueísmo – a divisão entre "nós, os bons" e "eles, os políticos, os maus" –, largamente utilizado em nossos dias, nos cega e nos impede de observar os fatos e de, a partir deles, encontrar soluções cabíveis.
A Operação Lava-Jato abre a possibilidade para a melhora da política com todas as consequências positivas advindas. O massacre maniqueísta, ao contrário, condena erroneamente toda uma classe e provoca desesperança.
Além disso, devemos levar em conta que a ética da política difere da ética fora dela. Norberto Bobbio (1909-2004) já havia nos alertado que a ética na política tem de ser pensada a partir do fato de o objetivo da ação política é o poder pelo poder.
É comum, para exemplificar, o emprego da omissão de informações no mundo político. Omitir, omittere em latim, consiste no ato de não mencionar ou de deixar de dizer com a intenção de esconder. Não custa lembrar que todos praticamos a omissão numa ou noutra situação de nossas vidas. E há até mesmo um nível tolerável de desonestidade em todos, como já constatou Dan Ariely. E em atividades nas quais ou se ganha ou se perde, o nível tende a aumentar.
Se "acabarmos com a classe política", como querem alguns, quais alternativas teremos? A bota de um militar a nos oprimir? O governo de um religioso fanático a nos impor suas verdades medievais?
Portanto, o trabalho admirável da Lava-Jato deve ser acompanhado da superação do maniqueísmo que abusa da generalização, do reducionismo, da ausência de autocrítica e da afirmação de que os "culpados são sempre os outros".