Começo fazendo uma confissão: fui, durante muito tempo, adepto dos downloads ilícitos de filmes e músicas. Desde 2002, tenho os mesmos arquivos da discografia completa do Led Zeppelin.
Passei por várias gerações de plataformas digitais para manter esse hábito. Napster, Audiogalaxy, Soulseek, Kazaa. Aí veio o Torrent, que, aliás, também serviu de canal para que um ídolo meu, Thom Yorke, vendesse um álbum em 2014. Foi minha primeira compra de música em muito tempo.
Depois mergulhei no cenário de música eletrônica e experimental independente, e utilizei (legalmente) o site Soundcloud, criado na Suécia e hoje sediado em Berlim. Foi quando minha irmã aderiu ao plano familiar do Spotify, uma mídia que fere meus princípios em relação a música ao priorizar, por exemplo, a navegação baseada em faixas em detrimento da escuta de álbuns completos. Vários artistas menos conhecidos não estavam lá, o que me fazia pensar que não me tornaria um usuário frequente.
E não é que o algoritmo do Spotify foi aprendendo sobre meu gosto musical e hoje é capaz de sugerir artistas espalhados pelo mundo que me agradam fortemente? Qual é a chance de eu curtir um libanês que toca alaúde e só tem 2 mil seguidores? Pois, sim, me encantou. Essa capacidade de identificar traços comuns em faixas tão diferentes que escuto é um dos diferenciais tecnológicos desse serviço online, que também foi criado na Suécia.
Com isso, vem um poder enorme sobre minha vida. Determinar, em certa medida, aquilo que vou conhecer e gostar, justamente em um campo altamente importante no processo de significação da minha experiência de vida: a cultura. Mexer profundamente com minha subjetividade usando algoritmos que sabem mais sobre mim do que eu mesmo consigo racionalizar.
A contraparte do Spotify no mundo do vídeo, o Netflix, conseguiu implantar em mim o hábito de assistir a séries, coisa que eu antes detestava. O esforço de pesquisa que a empresa californiana realizou para lançar House of Cards me atingiu em cheio. Fico me perguntando: até onde vai esse controle? Como podemos reagir a isso e nos tornarmos mais ativos nesse processo?