Nicolau Maquiavel, o fundador da moderna ciência política, cunhou a síntese do governo com uma frase que ficou bem conhecida: quando fizer o bem, faça-o aos poucos; quando for praticar o mal, convém fazê-lo de uma só vez. A reforma trabalhista do governo Temer é isso, o mal em dose cavalar.
São diversas medidas que, essencialmente, buscam transferir para o empregado custos da crise econômica. Mas o que mais chama atenção é instituir amplo horizonte de precarização a partir da prevalência do negociado sobre o legislado. O discurso é antigo e sedutor: permitir que sindicatos possam livremente barganhar e abrir mão de direitos assegurados na lei.
Há problema de conteúdo e de momento. A base da negociação é poder negociar de igual para igual; e não é segredo que trabalhadores não têm a mesma capacidade de fogo que empresários. Sem meias palavras e de forma muito simples: em tempos de crise, negociar é simplesmente retirar direitos e piorar condições de vida de assalariados. Então, se aumentar lucro torna-se finalidade social, desintegra-se a fraternidade, inviabiliza-se desenvolvimentismo, socializam-se custos, privatizam-se lucros e o último que sair, por favor, apague a luz do aeroporto.
Em linhas gerais, períodos de crise desaconselham a promoção de qualquer reforma precarizante, especialmente quando diz respeito a temas que não constituem os reais motivos das dificuldades vividas pelo país. Muito ao contrário, a imensa maioria do povo brasileiro ainda precisa que seus direitos sejam reafirmados, dentro de um modelo que promova dignidade e segurança.
Nenhum projeto de crescimento pode abandonar os alicerces de um mercado de trabalho civilizado e justo para todos. As propostas de reforma devem observar a Constituição, que prevê a construção progressiva de novos direitos, sempre no intuito de melhorar a condição social do trabalhador; jamais de reduzir conquistas históricas e fundamentais.
Apontar para a quebra de direitos e garantias sociais em momento como este é oportunismo político para tirar partido da situação econômica aflitiva e, assim, promover vantagens indevidas e danos permanentes. Talvez, nem Maquiavel fosse tão longe.