Diante do fato de terem sido realizadas logo depois do processo de impeachment, era inevitável que as eleições municipais, cuja primeira etapa chegou ontem ao fim, fossem influenciadas por temas ligados à crise política nacional. Em consequência, ficaram muitas vezes em um plano secundário questões vitais nos discursos de palanque, por estarem ligadas ao cotidiano dos munícipes, e para as quais os prefeitos eleitos agora e a serem definidos no segundo turno precisarão apontar providências eficazes. O desafio se amplia devido às inovações nas regras de campanha, que levaram muitos candidatos a chegarem ao final do primeiro turno com suas contas no vermelho, e à realidade de que os orçamentos municipais não suportam boa parte dos compromissos assumidos pelos candidatos.
Realizada sem a possibilidade de doações por parte de empresas, a campanha municipal que chegou ontem ao fim da primeira etapa marcada até mesmo por incidentes de violência teve um custo incomparavelmente menor do que as anteriores, demonstrando na prática que dinheiro a rodo não é sinônimo de democracia. A redução de recursos permitiu uma campanha com menos papel nas ruas e forçou a maioria dos candidatos a trocar o marketing por um diálogo mais direto com os 144 milhões de brasileiros habilitados a comparecer às urnas. Ainda assim, chama atenção que haja muito mais brasileiros dispostos a se candidatar do que a financiar campanhas com as quais se identificam. Em todo o país, incluindo os postulantes ao cargo de vice-prefeito, 496.888 se habilitaram a disputar votos. O total de doadores limitou-se a praticamente a metade ao final do primeiro turno.
Descrentes dos políticos, que em alguns casos até esconderam essa condição, os eleitores precisarão ser convencidos agora de que as promessas de campanha são factíveis. Não será missão fácil. Num país às voltas com o ajuste fiscal, muitos municípios já não contam hoje sequer com os recursos necessários para financiar questões essenciais como saúde e educação e para manter o pagamento da folha salarial dos servidores em dia. Ao final da campanha para o segundo turno e, particularmente, a partir da posse, é possível que essa situação se mostre ainda mais deteriorada.
O envolvimento direto de parlamentares federais contribuiu para que a campanha às eleições municipais acabasse servindo de pretexto para travar o andamento de reformas inadiáveis para o país. Por isso, definido o primeiro turno, é preciso retomar de imediato a agenda das mudanças estruturais. Entre elas, estão as necessárias para reequilibrar as finanças públicas, como a que impõe um limite aos gastos e a da Previdência, assim como a política, que contribua para levar os eleitores a confiar mais em quem os representa, a ponto de motivá-los até mesmo a financiar suas campanhas.